sábado, 30 de dezembro de 2017

O Verbo feito carne diviniza o homem

Do Tratado “Refutação de todas as heresias”, de Santo Hipólito, presbítero

(Cap. 10, 33-34: PG 16, 3452-3453) (Séc. III)

Não fundamentamos nossa fé em palavras sem sentido, nem nos deixamos arrastar pelos impulsos do coração ou persuadir pelo encanto de discursos eloqüentes. Nossa fé se fundamenta nas palavras pronunciadas pelo poder divino.

Estas palavras, Deus as confiou a seu Verbo que as pronunciou para afastar o homem da desobediência; não quis obrigá-lo à força, como a um escravo, mas chamou-o para uma decisão livre e responsável.

Esse Verbo, o Pai enviou à terra no fim dos tempos; não o queria mais pronunciado por meio dos profetas nem anunciado por meio de prefigurações obscuras, mas ordenou que se manifestasse de forma visível, a fim de que o mundo, ao vê-lo, pudesse salvar-se.

Sabemos que o Verbo assumiu um corpo no seio da Virgem e transformou o homem velho em uma nova criatura. Sabemos que ele se fez homem da nossa mesma substância. Se não fosse assim, em vão nos teria mandado imitá-lo como Mestre. De fato, se esse homem tivesse sido formado de outra substância, como poderia ordenar-me que fizesse as mesmas coisas que ele fez, a mim, frágil que sou por natureza? Como poderíamos então dizer que ele é bom e justo?

Para que não o julgássemos diferente de nós, suportou fadigas, quis ter fome e não recusou ter sede, dormiu para descansar, não rejeitou o sofrimento, submeteu-se à morte e manifestou a sua ressurreição. Em tudo isto, ofereceu sua própria humanidade como primícias, para que tu não desanimes no meio do sofrimento, mas, reconhecendo tua condição de homem, esperes também receber o que Deus lhe deu.

Quando contemplares Deus tal qual é, terás um corpo imortal e incorruptível, como a alma, e possuirás o reino dos céus, tu que, peregrinando na terra, conheceste o Rei celeste; viverás então na intimidade de Deus e serás herdeiro com Cristo.

Todos os males que suportaste sendo homem, Deus os permitiu precisamente porque és homem; mas tudo o que pertence a Deus, ele promete conceder-te quando fores divinizado e te tornares imortal. Conhece-te a ti mesmo, reconhecendo a Deus que te criou; pois conhecer a Deus e ser por ele conhecido é a sorte daquele que foi chamado por Deus.

Por conseguinte, não vos envolvais em contendas como inimigos, nem penseis em voltar atrás. Cristo é Deus acima de todas as coisas, ele que decidiu libertar os homens do pecado, renovando o velho homem que tinha criado à sua imagem desde o princípio, e manifestando nesta imagem renovada o amor que tem por ti. Se obedeceres aos seus mandamentos e por tua bondade te tornares imitador daquele que é o Bem supremo, serás semelhante a ele e ele te glorificará. Deus que tudo pode e tudo possui te divinizará para sua glória.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Na plenitude dos tempos, veio a nós a plenitude da divindade

Dos Sermões de São Bernardo, abade
(Sermo 1 in Epiphania Domini, 1-2:
PL 133, 141-143) (Séc. XII)

Apareceu a bondade e a humanidade de Deus, nosso Salvador (cf. Tt 3,4). Demos graças a Deus que nos dá tão abundante consolação neste exílio, nesta peregrinação, nesta vida tão miserável.

Antes de aparecer a sua humanidade, a sua bondade também se encontrava oculta; e, no entanto, esta já existia, porque a misericórdia do Senhor é eterna. Mas como poderíamos conhecer tão grande misericórdia? Estava prometida, mas não era experimentada e por isso muitos não acreditavam nela. Muitas vezes e de muitos modos, Deus falou por meio dos profetas (cf. Hb 1,1). E dizia: Eu tenho pensamentos de paz e não de aflição (cf. Jr 29,11). E o que respondia o homem, que experimentava a aflição e desconhecia a paz? Até quando direis paz, paz e não há paz? Por esse motivo, os mensageiros da paz choravam amargamente (cf. Is 33,7), dizendo: Senhor, quem acreditou no que ouvimos? (cf. Is 53,1). Agora, porém, os homens podem acreditar ao menos no que vêem com seus olhos, pois os testemunhos de Deus são verdadeiros (cf. Sl 92,5); e para se tornar visível, mesmo àqueles que têm a vista enfraquecida, armou uma tenda para o sol (Sl 18,6).

Agora, portanto, não se trata de uma paz prometida, mas enviada; não adiada, mas concedida; não profetizada, mas presente. Deus Pai a enviou à terra, por assim dizer, como um saco pleno de sua misericórdia. Um saco que devia romper-se na paixão para derramar o preço de nosso resgate nele escondido; um saco, sim, que embora pequeno estava repleto. Pois, um menino nos foi dado (cf. Is 9,5), mas nele habita toda a plenitude da divindade (Cl 2,9). Quando chegou a plenitude dos tempos, veio também a plenitude da divindade.

Veio na carne para se revelar aos que eram de carne, de modo que, ao aparecer sua humanidade, sua bondade fosse reconhecida. Com efeito, depois que Deus manifestou sua humanidade, sua bondade já não podia ficar oculta. Como poderia expressar melhor sua bondade senão assumindo minha carne? Foi precisamente a minha carne que ele assumiu, e não a de Adão, tal como era antes do pecado.

Poderá haver prova mais eloqüente de sua misericórdia do que assumir nossa miséria? Poderá haver maior prova de amor do que o Verbo de Deus se tornar como a erva do campo por nossa causa? Senhor, que é o homem, para dele assim vos lembrardes e o tratardes com tanto carinho? (Sl 8,5). Por isso, compreenda o homem até que ponto Deus cuida dele; reconheça bem o que Deus pensa e sente a seu respeito. Não perguntes, ó homem, por que sofres, mas por que ele sofreu por ti. Vendo tudo o que fez em teu favor, considera o quanto ele te estima, e assim compreenderás a sua bondade através da sua humanidade. Quanto menor se tornou em sua humanidade, tanto maior se revelou em sua bondade; quanto mais se humilhou por mim, tanto mais digno é agora do meu amor. Diz o Apóstolo: Apareceu a bondade e a humanidade de Deus, nosso Salvador. Na verdade, como é grande e manifesta a bondade de Deus! E dá-nos uma grande prova de bondade Aquele que quis associar à humanidade o nome de Deus.

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Toma consciência, ó cristão, da tua dignidade

Dos Sermões de São Leão Magno, papa

(Sermo 1 in Nativitate Domini, 1-3:
PL 54, 190-193)

(Séc. V)

Hoje, amados filhos, nasceu o nosso Salvador. Alegremo-nos. Não pode haver tristeza no dia em que nasce a vida; uma vida que, dissipando o temor da morte, enche-nos de alegria com a promessa da eternidade.

Ninguém está excluído da participação nesta felicidade. A causa da alegria é comum a todos, porque nosso Senhor, vencedor do pecado e da morte, não tendo encontrado ninguém isento de culpa, veio libertar a todos. Exulte o justo, porque se aproxima da vitória; rejubile o pecador, porque lhe é oferecido o perdão; reanime-se o pagão, porque é chamado à vida.

Quando chegou a plenitude dos tempos, fixada pelos insondáveis desígnios divinos, o Filho de Deus assumiu a natureza do homem para reconciliá-lo com o seu Criador, de modo que o demônio, autor da morte, fosse vencido pela mesma natureza que antes vencera.

Eis por que, no nascimento do Senhor, os anjos cantam jubilosos: Glória a Deus nas alturas; e anunciam: Paz na terra aos homens de boa vontade (Lc 2,14). Eles vêem a Jerusalém celeste ser formada de todas as nações do mundo. Diante dessa obra inexprimível do amor divino, como não devem alegrar-se os homens, em sua pequenez, quando os anjos, em sua grandeza, assim se rejubilam?

Amados filhos, demos graças a Deus Pai, por seu Filho, no Espírito Santo; pois, na imensa misericórdia com que nos amou, compadeceu-se de nós. E quando estávamos mortos por causa das nossas faltas, ele nos deu a vida com Cristo (Ef 2,5) para que fôssemos nele uma nova criação, nova obra de suas mãos.

Despojemo-nos, portanto, do velho homem com seus atos; e tendo sido admitidos a participar do nascimento de Cristo, renunciemos às obras da carne.

Toma consciência, ó cristão, da tua dignidade. E já que participas da natureza divina, não voltes aos erros de antes por um comportamento indigno de tua condição. Lembra-te de que cabeça e de que corpo és membro. Recorda-te que foste arrancado do poder das trevas e levado para a luz e o reino de Deus.

Pelo sacramento do batismo te tornaste templo do Espírito Santo. Não expulses com más ações tão grande hóspede, não recaias sob o jugo do demônio, porque o preço de tua salvação é o sangue de Cristo.

domingo, 24 de dezembro de 2017

A verdade brotou da terra e a justiça olhou do alto do céu

Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo

(Sermo 185: PL 38, 997-999)

(Séc. V)

Desperta, ó homem: por tua causa Deus se fez homem. Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos e sobre ti Cristo resplandecerá (Ef 5,14). Por tua causa, repito, Deus se fez homem.

Estarias morto para sempre, se ele não tivesse nascido no tempo. Jamais te libertarias da carne do pecado, se ele não tivesse assumido uma carne semelhante à do pecado. Estarias condenado a uma eterna miséria, se não fosse a sua misericórdia. Não voltarias à vida, se ele não tivesse vindo ao encontro da tua morte. Terias perecido, se ele não te socorresse. Estarias perdido, se ele não viesse salvar-te.

Celebremos com alegria a vinda da nossa salvação e redenção. Celebremos este dia de festa, em que o grande e eterno Dia, gerado pelo Dia grande e eterno, veio a este nosso dia temporal e tão breve. Ele se tornou para nós justiça, santificação e libertação, para que, como está escrito, “quem se gloria, glorie-se no Senhor” (1Cor 1,30-31). A verdade brotará da terra (Sl 84,12), o Cristo que disse: eu sou a verdade (Jo 14,6), nasceu da Virgem. E a justiça olhou do alto do céu (cf. Sl 84,12), porque o homem, crendo naquele que nasceu, é justificado não por si mesmo, mas por Deus.

A verdade brotou da terra porque o Verbo se fez carne (Jo 1,14). E a justiça olhou do alto do céu porque todo o dom precioso e toda a dádiva perfeita vêm do alto (Tg 1,17). A verdade brotou da terra, isto é, da carne de Maria. E a justiça olhou do alto do céu porque o homem não pode receber coisa alguma, se não lhe for dada do céu (Jo 3,27).

Justificados pela fé, estamos em paz com Deus (Rm 5,1) porque a justiça e a paz se beijaram (cf. Sl 84,11) por intermédio de nosso Senhor Jesus Cristo, pois a verdade brotou da terra. Por ele tivemos acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes e nos gloriamos, na esperança da glória de Deus (Rm 5,2). Não disse “de nossa glória”, mas da glória de Deus, porque a justiça não procede de nós, mas olha do alto do céu. Portanto, quem se gloria não se glorie em si mesmo, mas no Senhor. Eis por que, quando o Senhor nasceu da Virgem, os anjos cantaram: Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade (Lc 2,14 Vulgata).

Como veio a paz à terra senão por ter a verdade brotado da terra, isto é, Cristo ter nascido em carne humana? Ele é a nossa paz: de dois povos fez um só (cf. Ef 2,14), para que fôssemos homens de boa vontade, unidos uns aos outros pelo suave vínculo da caridade. Alegremo-nos com esta graça, para que nossa glória seja o testemunho da nossa consciência, e assim nos gloriaremos, não em nós mesmos, mas no Senhor. Por isso disse o Salmista: Vós sois a minha glória que levanta a minha cabeça (Sl 3,4). Na verdade, que graça maior Deus poderia nos conceder do que, tendo um único Filho, fazê-lo Filho do homem e reciprocamente fazer os filhos dos homens serem filhos de Deus? Procurai o mérito, procurai a causa, procurai a justiça; e vede se encontrais outra coisa que não seja a graça de Deus.

sábado, 9 de dezembro de 2017

Dez anos de serviço à Palavra, à Caridade e à Liturgia

Hoje eu completo dez anos de ordenação diaconal. Muitas pessoas sempre me perguntam por que quis ser diácono, ou, porque ser diácono se você pode fazer as mesmas coisas sendo leigo. Essas perguntas me perseguem desde então.
Ao tentar responde-las, busco oração e estudo sobre a vocação diaconal. O que espera Deus e a Igreja dos Diáconos? Somos necessários? O que devemos fazer? Devemos ser vistos pelo que somos, ou pelo que fazemos?
As respostas vão aparecendo aos poucos. Às vezes, vou até as raízes, a Sagrada Escritura. Em outros momentos, consulto os documentos da Igreja. Tentando buscar uma resposta, uma resposta para os outros. E por que não dizer, para mim também?
Em cada grau do Sacramento da Ordem há algo que o representa. No caso dos diáconos é a entrega do Livro dos Evangelhos. Diz o rito que “os ordenados, com a veste diaconal, aproximam-se do Bispo e ajoelham-se diante dele; o Bispo lhes entrega o Livro dos Evangelhos. Os diáconos receberão o Livro dos Evangelhos, ao qual deverá Conformar a sua vida, anunciando-o com fidelidade e profunda autenticidade”.
Desta introdução, destaco a “veste diaconal”, o ajoelhar-se diante do Bispo, o recebimento do “Livro dos Evangelhos”, o “Conformar” a vida ao Evangelho, o anunciar com “fidelidade e profunda autenticidade”.
Ao receber o “Livro dos Evangelhos” revestido com a “veste diaconal”, a Igreja mostra a toda comunidade que o Diácono é o Ministro da Palavra. E mais ainda, que ele deverá “conformar” (fazer-se da mesma forma) sua vida com o Evangelho. E assim, anunciar com “fidelidade e autenticidade”. Mas uma autenticidade profunda. Na raiz da vida. Na essência.
Essas são as palavras do Bispo: “Recebe o Evangelho de Cristo, do qual foste constituído mensageiro; transforma em fé viva o que leres, ensina aquilo que creres e procura realizar o que ensinares”. Mais do que um Rito, receber o Livro dos Evangelhos faz com que o Diácono se torne seu mensageiro. E aí, vamos aos livros das Sagradas Escrituras para encontrarmos a fundamentação bíblica desse rito.
Inicialmente, lembro a passagem de Lucas 4,18-19: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa Notícia aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos, e para proclamar um ano de graça do Senhor”. Jesus diz qual a sua missão. Toda vez que o diácono se aproxima da mesa da Palavra e proclama a Palavra de Salvação, essa passagem da Escritura se cumpre.
Lembro ainda, Santo Estêvão, que “cheio do Espírito Santo” profere o discurso que o levaria a morte. Uma pregação que anunciou a “boa nova”, e por isso, foi condenado a morte. Em seguida, outro diácono, Felipe explica ao eunuco a palavra de Deus (At. 8,26ss). Fora chamado de o Evangelista por Paulo (Atos 21,8).
Os bispos da Igreja Católica, por inspiração do Espírito Santo, sentiram a necessidade de restabelecer o Diaconato como grau Permanente do Sacramento da Ordem. Tiraram a transitoriedade do Diaconato. Sentiram a necessidade de ter a visibilidade de uma Igreja que fosse ministerial, e não apenas sacerdotal.
A Constituição Dogmática Lumen Gentiun, que fala sobre a Igreja, afirma no número 29 que “confortados pela graça sacramental, servem o povo de Deus no serviço (diaconia) da liturgia, da palavra e da caridade”. E acrescenta que “pertence ao diácono (...) administrar o batismo solene, conservar e distribuir a eucaristia, assistir e abençoar em nome da Igreja aos matrimônios, levar o viático aos moribundos, ler a Sagrada Escritura aos fiéis, instruir e exortar o povo, presidir ao culto e à oração dos fiéis, administrar os sacramentais, presidir os ritos funerais e da sepultura”.
Nas “Normas Fundamentais para a Formação dos Diáconos Permanentes”, lemos que “a espiritualidade do serviço é uma espiritualidade de toda a Igreja (...) e para que toda a Igreja possa viver melhor esta espiritualidade é que o Senhor lhe dá um sinal vivo e pessoal do seu próprio ser de servo. Por isso, de modo específico, ela é a espiritualidade do diácono. (...) Mediante a sagrada ordenação, é constituído na Igreja ícone vivo de Cristo servo” (11).
O “Diretório do Ministério e da Vida dos Diáconos Permanentes”, afirma que o “diácono (...) deve conhecer a cultura, as aspirações e os problemas do seu tempo. (...) Ele é chamado neste contexto a ser sinal vivo de Cristo Servo e ao mesmo tempo é chamado a assumir a missão da Igreja de ‘investigar a todo o momento os sinais dos tempos, interpretá-los à luz do Evangelho, para que assim possa responder, de modo adaptado em cada geração, às eternas perguntas dos homens a cerca do sentido da vida presente e da futura e da relação entre ambas’” (43).
O documento de Aparecida reforça e diz que os diáconos permanentes são “fortalecidos, em sua maioria, pela dupla sacramentalidade do Matrimônio e da Ordem”. E que devem estar a “serviço da Palavra, da caridade e da liturgia”. E ainda, que se colocam à disposição para “acompanhar a formação de novas comunidades eclesiais” (Doc.Ap. 205).
E a CNBB afirma que “na promoção social e na vivência das obras de misericórdia, o diácono assume a opção preferencial pelos pobres, marginalizados e excluídos. Ele é apóstolo da caridade com os pobres, envolvido com a conquista de sua dignidade e de seus direitos econômicos, políticos e sociais. Está próximo da dor do mundo. Deixa-se tocar e sensibilizar pela miséria e pelas provações da vida. Reveste-se de especial compaixão pelos: “migrantes, vítimas da violência, os deslocados e refugiados, as vítimas do tráfico de pessoas e sequestros, os desaparecidos, os enfermos de HIV e de enfermidades endêmicas, os tóxico-dependentes, idosos, meninos e meninas, que são vítimas da prostituição, pornografia e violência ou do trabalho infantil, mulheres maltratadas, vítimas de exclusão e do tráfico para a exploração sexual, pessoas com capacidades diferentes, grandes grupos de desempregados/as, os excluídos pelo analfabetismo tecnológico, as pessoas que vivem nas ruas das grandes cidades, os indígenas e africanos, agricultores sem terras e trabalhadores das minas” (DA, n.402, in Doc. 96 – CNBB – Diretrizes para o Diaconado Permanente no Brasil - 58).
Então, se sua comunidade tem um diácono, reze por ele. Se sua comunidade ainda não o tem, ore a Deus para suscite vocações ao diaconato permanente.

Ore pelos diáconos. São importantes para a Igreja, principalmente para a construção da “Civilização do Amor”.

domingo, 3 de dezembro de 2017

Vigiai!

Marcos 13,33-37: Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 33Cuidado! Ficai atentos, porque não sabeis quando chegará o momento. 34É como um homem que, ao partir para o estrangeiro, deixou sua casa sob a responsabilidade de seus empregados, distribuindo a cada um sua tarefa. E mandou o porteiro ficar vigiando. 35Vigiai, portanto, porque não sabeis quando o dono da casa vem: à tarde, à meia-noite, de madrugada ou ao amanhecer. 36Para que não suceda que, vindo de repente, ele vos encontre dormindo. 37O que vos digo, digo a todos: Vigiai!'
Estamos iniciando a preparação para o Natal. É o primeiro Domingo do Advento. Tempo de Espera. Momento de olharmos para dentro de nós a sabermos como estamos nos preparando para a vinda de Jesus. E esta preparação não é apenas no Espírito, mas deve traduzir-se na vida do outro.
Jesus disse que os que herdariam o Reino dos Céus seriam aqueles que tivessem alimentado os famintos, dado de beber aos sedentos, vestido os nus, visitado os doentes e encarcerados, e acolhido os peregrinos. E que sempre isso tivesse sido feito a um dos mais pequeninos dos irmãos de Jesus, era a ele que o teríamos feito.
Para Jesus, esperar não é sinal de passividade. Não é para ficar sentado, à toa na vida, esperando a banda passar. Para Deus, e para Jesus, esperar é sinal de missão. Aguardar Deus que vem é ir ao encontro do outro.
Por isso, ele disse, “ficai atentos”. “Ficai atentos” para não cairdes em tentação. “Ficai atentos” para não voltar às costas para o irmão/irmã. “Ficai atentos” para fazer o bem. “Ficai atentos” para “dar bom conselho”, para “ensinar os que ignoram”, para “corrigir os que erram”. “Ficai atentos” para ter espírito conciliador: para “consolar os tristes”, para “perdoar as injúrias”, para “suportar com paciência as fraquezas do nosso próximo”. E por último, “ficai atentos” para “rogar a Deus pelos vivos e pelos defuntos”.
Mas só pode ficar atento aquele ou aquela que vigia. Portanto, “Vigiai”! E somente podemos vigiar se estivermos em atitude de oração. Em Marcos, 14,38 Jesus orienta seus discípulos a orarem para não caírem em tentação: “Vigiai e orai, para não cairdes em tentação”. E ainda acrescenta que “o Espírito está pronto, mas a carne é fraca”. Quer dizer, a vontade humana pode abafar aquilo que é desejo do Espírito em nós (confira a parábola do semeador).
Na oração do Pai Nosso dizemos, “não nos deixeis cair em tentação”. Não nos deixe cair na tentação de não perdoar o nosso irmão, a nossa irmã. Não nos deixe cair na tentação de esquecermos os que sofrem. Não nos deixe caria na tentação de não crer na palavra de Deus.
Iniciamos o Advento. Que quando o Senhor voltar, nos encontre vigilantes. Atentos. Em atitude de serviço e de espera.
Oremos: “Ó Deus todo-poderoso, concedei a vossos fiéis o ardente desejo de possuir o reino celeste, para que, acorrendo com as nossas boas obras ao encontro do Cristo que vem, sejamos reunidos à sua direita na comunidade dos justos. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo”.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

“Vinde benditos de meu Pai” (Mt. 25,34)

Nos Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola, existe uma meditação que fala do “sentir com a Igreja”. A nona regra diz que devemos “louvar os mandamentos da Igreja, tendo sempre o ânimo pronto para buscar razões em sua defesa, e, de nenhum modo, para ofendê-la”. E continua na décima regra afirmando que “devemos ser mais prontos para (...) apoiar e louvar as determinações, recomendações e costumes dos que nos precederam, pois ainda que não sejam ou não fossem dignos de louvor, falar contra eles geraria mais murmuração e escândalos que proveito (...)”.
Nos evangelhos encontramos duas situações que podem iluminar a nossa convivência religiosa nos tempos atuais.
No evangelho de João lemos a oração da unidade feita por Jesus. Ele pede ao Pai para que todos os que crerem nele possam formar uma comunidade unida, tal como ele e o Pai são um.
“Eu não te peço só por estes, mas também por aqueles que vão acreditar em mim por causa da palavra deles, para que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti. E para que também eles estejam em nós, a fim de que o mundo acredite que tu me enviaste”. (Jo. 17,20-21).
O evangelista Marcos registra outra conversa de Jesus com seus apóstolos. Eles relatam a Jesus que encontraram alguém que expulsava demônios em nos de Jesus, mas não faziam parte do grupo deles. E contemplem a cena: “João disse a Jesus: Mestre, vimos um homem que expulsa demônios em teu nome. Mas nós lhe proibimos, porque ele não nos segue. Jesus disse: Não lhe proíbam, pois ninguém faz um milagre em meu nome e depois pode falar mal de mim. Quem não está contra nós, está a nosso favor”. (Mc. 9,38-40).
Jesus nunca rejeitou aqueles e aquelas que sempre fizeram o bem aos outros independentemente da origem da pessoa. Lembremos da história do Samaritano.
Tendo em vista esses fatos, a Igreja Católica, na década de 60 do século XX, realizou o Concílio Ecumênico do Vaticano II. Neste concílio, foram publicados três declarações sobre as relações da Igreja com as diversas manifestações religiosas no mundo. São elas, a “Unitatis Redintegratio – sobre o ecumenismo; Nostra Aetate – relações com as religiões não cristãs; Dignitatis Humane – sobre a liberdade religiosa”. Vejamos um breve resumo das introduções de cada uma delas.
Unitatis Redintegratio – sobre o ecumenismo: “são numerosas as comunhões cristãs que se apresentam aos homens como legítimas herança de Jesus Cristo.(...) O Senhor (...) começou a infundir nos cristãos separados entre si a compunção de coração e desejo de união. (...). Entre os nossos irmãos separados (...) surgiu um movimento em ordem à restauração da unidade de todos os cristãos. Este movimento de unidade é chamado de ecumenismo. (...) Aspiram a uma Igreja de Deus uma e visível. (...) Este sagrado Concílio considera todas essas coisas com muita alegria. Tendo já declarado a doutrina sobre a Igreja, movida pelo desejo de restaurar a unidade de todos os cristãos, quer propor a todos os católicos os meios, os caminhos e as formas com que eles possam corresponder a esta divina vocação e a esta graça”.
Nostra Aetate – relações com as religiões não cristãs: “(...) a Igreja examina muito atentamente a natureza das suas relações com as religiões não-cristãs. No seu dever de promover a unidade e a caridade entre os homens, ou melhor entre os povos, examina primeiro aquilo que os homens têm de comum, e o que os move a viverem juntos o próprio destino. (...) Os homens esperam, das diversas religiões, uma resposta aos recônditos enigmas da condição humana, que ontem como hoje perturbam profundamente o coração humano: Que é o homem? Qual o sentido e o fim da vida? Que é o bem e que é o pecado? Qual a origem e qual a finalidade do sofrimento? Qual o caminho para chegar à verdadeira felicidade? Que é a morte, o juízo e a retribuição depois da morte? Em que consiste o mistério último e inefável que envolve a nossa existência, do qual tiramos a nossa origem e para o qual nos encaminhamos”?
Ao falar das religiões não cristãs, a Declaração afirma que “a Igreja católica não rejeita nada que seja verdadeiro e santo nestas religiões. Considera com sincero respeito esses modos de agir e viver, esses preceitos e doutrinas, que, embora em muitos pontos difiram do que ela mesma crê e propõe, não raro refletem um raio daquela Verdade que ilumina todos os homens. (...) Eis porque a Igreja exorta os seus filhos a que, com prudência e caridade, por meio do diálogo e da colaboração com os membros das outras religiões, e sempre dando testemunho da fé e da vida cristã, reconheçam, conservem e façam progredir os bens espirituais, morais e os valores socioculturais que nelas se encontram”.
E conclui, dizendo que “ nós não podemos invocar Deus, Pai de todos os homens, se nos recusamos a comportar-nos como irmãos para com alguns homens criados à imagem de Deus. (...) Rejeita-se o fundamento de toda a teoria ou modo de proceder que introduz, entre homem e homem, entre povo e povo, discriminações quanto à dignidade humana e aos direitos que dela derivam”. E afirma que “a Igreja reprova, como contrária à vontade de Cristo, qualquer espécie de discriminação entre os homens ou de perseguição perpetrada por motivos de raça ou de cor, de condição social ou de religião”.
Dignitatis Humane – sobre a liberdade religiosa: “a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa (...) todos os homens devem estar livres de coação, quer por parte dos indivíduos, que os grupos sociais ou qualquer autoridade humana; (...) em matéria religiosa, ninguém seja forçado a agir contra a própria consciência, nem impedido (...) de proceder segundo a mesma, em particular e em público. (...)  O direito à liberdade religiosa se funda realmente na própria dignidade da pessoa humana. (...) Este direito da pessoas humana à liberdade religiosa (...) deve ser de tal modo reconhecido que se torne um direito civil. (...) O direito à liberdade religiosa não se funda na disposição subjetiva da pessoa, mas na sua própria natureza”.
Não é a religião que salva, mas o amor com que tratamos o próximo. A caridade que nos impele ao outro. O amor com que tratamos aqueles que sofrem, independentemente da religião que professa.
O próprio Jesus disse, “‘Venham vocês, que são abençoados por meu Pai. Recebam como herança o Reino que meu Pai lhes preparou desde a criação do mundo. 35 Pois eu estava com fome, e vocês me deram de comer; eu estava com sede, e me deram de beber; eu era estrangeiro, e me receberam em sua casa; 36 eu estava sem roupa, e me vestiram; eu estava doente, e cuidaram de mim; eu estava na prisão, e vocês foram me visitar’. 37 Então os justos lhe perguntarão: ‘Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, com sede e te demos de beber? 38 Quando foi que te vimos como estrangeiro e te recebemos em casa, e sem roupa e te vestimos? 39 Quando foi que te vimos doente ou preso, e fomos te visitar?’ 40 Então o Rei lhes responderá: ‘Eu garanto a vocês: todas as vezes que vocês fizeram isso a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizeram.’” (Mt. 25,34-40). Em nenhum momento ele disse que somente aqueles que o seguissem receberiam em herança o Reino de Deus.
Tudo o que for ensinado diferentemente disso, não é digno de crédito.
Deus nos abençoe.

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

“Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” (Mt. 22,21b).

O evangelho de deste domingo, 22/10/2017, trata de quem vamos servir. A leitura desse texto me fez pensar em outra frase de Jesus, também do Evangelho de Mateus: “Ninguém pode servir a dois senhores. Porque, ou odiará a um e amará o outro, ou será fiel a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e às riquezas” (Mt. 6,24).
Muitas pessoas entendem de foram equivocada essas duas passagens. Partilho com vocês meu entendimento.
Primeiramente, os fariseus, os herodianos, e toda a cúpula do poder instituído, fosse ele civil (Rei), ou religioso (fariseus) queriam arrumar um pretexto para ele fosse preso.
Como não conseguiram que ele caísse pelas leis religiosas, tentaram pela vertente política, queriam que Jesus denunciasse a exploração do governo romano sobre Jerusalém.
Caso Jesus disse que não se deveria dar à Roma o que lhe era devido, ele seria acusado de subversão. Caso ele mandasse pagar a taxa imposta por Roma, ele estria ao lado dos que oprimiam (e oprimem) o povo mais pobre.
Uma tentativa e tanto. Dir-se-ia no jogo de bilhar, “uma sinuca de bico”.
O evangelista diz que Jesus conhecia o pensamento deles. Sabia que o queriam pegar numa armadilha. Aqui um parênteses. Se observarmos nossas palavras e atitudes hoje, veremos que fazemos as mesmas coisas. Em muitos grupos religiosos que se sentem contrariados em suas vontades, logo ouvimos dizer: “lá vem ele querendo mudar tudo”! Pessoas assim não são abertas à graça de Deus. Não compreendem de que Deus permite mudanças, desde que seja para o bem.
Diante daquela situação, Jesus então, conhecedor da moeda que era pago imposto, pergunta, “de quem é a figura e a inscrição nesta moeda”? Ouve a resposta: “De César”. Quer dizer, de Roma. Do poder opressor. Daquele que nos permite viver nossa religião, se continuarmos a pagar o imposto.
Na vida temos duas atitudes distintas: ou servimos a Deus, ou nos sujeitamos às leis de morte e pecado do poder constituído. A quem Jesus servia? Era a hora de mostrar que ele vinha de Deus. Era hora de mostrar a quem a humanidade pertence. Era hora dizer que somos de Deus, pois somos sua imagem e semelhança.
O que fazer, então? Vejam a saída fantástica. Devemos dar a Deus o que lhe pertence, a nossa vida por inteiro. O nosso coração. Viver as bem-aventuranças. As nossas forças. A nossa vontade (ou vontades). A nossa liberdade. A nossa memória. Nossa vida pertence a Deus. E a ele devemos restituir tudo. Tudo o que for de Deus, a Deus deve ser devolvido.
E o que temos que dar a César? Apenas uma moeda com uma figura impressa e algumas palavras. César não é nada diante de Deus. Um Deus que tirou o povo do Egito. Um Deus que conduziu o povo pelo deserto. Um Deus que alimentou esse povo. Um Deus que deu água para beber. Um Deus que caminhava ao lado do povo na Arca da Aliança. Deus caminha junto. César oprime o povo. Deus liberta. César escraviza. Deus ama. Cesar rouba. Em uma breve frase, Jesus desconcertou aqueles que o queriam lhe acusar de alguma coisa. E o pior de tudo, eram judeus tal como Jesus.
Abramos bem nossos ouvidos para a leitura de hoje. A quem estamos servindo, aos poderes desse mundo (que oprime, mata, sufoca, rouba), ou a Deus (que liberta, que abre os olhos e ouvidos, que faz coxos andarem, que quer instaurar uma mundo de paz)?
Sejamos honestos a nós mesmos, a quem estamos servindo, a César ou a Deus? Lembrando que servir a César e deixar que todo nosso egoísmo, prepotência, arrogância aflorem em nós. E seguir a Deus é deixar que os frutos do espírito aflorem em nós: “amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, lealdade, mansidão, domínio próprio” (Gal 6,22). E ainda, “os que pertencem a Jesus Cristo crucificaram a carne com suas paixões e seus desejos. Se vivemos pelo Espírito, procedamos de acordo com o Espírito. Não busquemos vanglória, provocando-nos ou invejando-nos uns aos outros” (Gal. 6,24-26).

Deus vos abençoe.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

“Os eleitos de Deus”

Santo Inácio de Loyola, em seus Exercícios Espirituais, nos fala de “exercícios de repetição”. O que isso quer dizer? Significa que podemos voltar a uma meditação feita no dia anterior, ou no mesmo dia do retiro, para tirar proveito daquela Palavra rezada. Junte-se a isso a seguinte instrução de Inácio que diz que “não é o muito saber que sacia e satisfaz a alma, mas o sentir e saborear as coisas internamente”.
Voltando à questão do evangelho de Mateus, 22,1-14; e mais especificamente ao versículo 12, onde se lê: “Amigo, como entrastes aqui sem o traje de festa”? Devemos saborear essa palavra com tudo aquilo que vemos na pregação de Jesus e dos apóstolos.
Volto a questão da roupa para se estar na festa do Reino dos Céus. Então, São Paulo ao escrever para a comunidade dos Colossenses, diz: “vistam-se de sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão, paciência. Suportem-se uns aos outros e se perdoem mutuamente, sempre que tiverem queixa contra alguém. Cada um perdoe o outro, do mesmo modo que o Senhor perdoou vocês. E acima de tudo, vistam-se com o amor, que é o laço da perfeição” (Col. 3,12-14).
Paulo apresenta com que veste devemos nos revestir para estarmos na festa para a qual fomos convidados no Reino dos Céus.
A roupa deve estar em função do outro, e não em função de mim de mesmo. “Amabilidade, humildade, modéstia, paciência”, são ações que dizem respeito ao outro, àquele que devemos perdoar como pedimos perdão para as nossas ofensas (lembra-se do Pai-Nosso?). E ele acrescentou, “perdoai-vos, se alguém tem queixa do outro; como o Senhor vos perdoou, fazei assim também vós”.
Então, estar com a veste adequado para a Festa do Reino dos Céus deverá ser o perdão, o amor. E um detalhe, quem perdoar, quem amar? Todos e todas. Pois, Deus não faz acepção de pessoas nem de denominação religiosa (ele faz o sol nascer sobre bons e maus – Mateus 5,45). Não devemos amar e perdoar somente aqueles que estão na nossa religião. Devemos amar até aqueles que são contra nós. Esse é o amor que Deus quer de nós.
Deus nos abençoe!

Diácono Gayoso

domingo, 15 de outubro de 2017

"Onde haverá choro e ranger de dentes"

Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus 22,1-14: Naquele tempo: Jesus voltou a falar em parábolas aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo, 2dizendo: 'O Reino dos Céus é como a história do rei que preparou a festa de casamento do seu filho. 3E mandou os seus empregados para chamar os convidados para a festa, mas estes não quiseram vir. 4O rei mandou outros empregados, dizendo: `Dizei aos convidados: já preparei o banquete, os bois e os animais cevados já foram abatidos e tudo está pronto. Vinde para a festa!' 5Mas os convidados não deram a menor atenção: um foi para o seu campo, outro para os seus negócios, 6outros agarraram os empregados, bateram neles e os mataram. 7O rei ficou indignado e mandou suas tropas para matar aqueles assassinos e incendiar a cidade deles. 8Em seguida, o rei disse aos empregados: `A festa de casamento está pronta, mas os convidados não foram dignos dela. 9Portanto, ide até às encruzilhadas dos caminhos e convidai para a festa todos os que encontrarde.'10Então os empregados saíram pelos caminhos e reuniram todos os que encontraram, maus e bons. E a sala da festa ficou cheia de convidados. 11Quando o rei entrou para ver os convidados, observou ali um homem que não estava usando traje de festa 12e perguntou-lhe: `Amigo, como entraste aqui sem o traje de festa?' Mas o homem nada respondeu. 13Então o rei disse aos que serviam: `Amarrai os pés e as mãos desse homem e jogai-o fora, na escuridão! Ali haverá choro e ranger de dentes'. 14Por que muitos são chamados, e poucos são escolhidos.'
Uma história fantástica. Uma história com elementos do nosso dia-a-dia, uma festa. Com tudo o que uma festa precisa ter. Boa comida, boa bebida. E convidados que são amigos do dono da casa, do dono da festa.
Mas essa história tem um quê diferente. Depois de tudo preparado, os “amigos” rejeitam a festa. O Rei, dono da festa, na nossa história, o próprio Deus, manda os serventes irem às encruzilhadas buscarem quem não faz parte da corte. Eles obedecem, e trazem bons e maus. Não é função do servo fazer distinção de pessoas. Todos estão na sala da festa.
Então, entra o Rei. O dono da festa. E observa que havia uma pessoa sem o traje de festa. E que traje era esse que lhe faltava?
Se estamos falando de Jesus. Se é uma parábola. Se é para falar de Deus e das coisas do Reino dos Céus, então essa “veste” tem que ter algum significado.
Vejamos. Jesus havia deixado um mandamento: “amai-vos uns aos outros”. Amar ao próximo é uma das “roupas”. É não fazer acepção de pessoas. É não discriminar. Nós, que somos os serventes, não devemos fazer acepção de pessoas. Devemos apenas amar.
Outra roupa é ser caridoso. Dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede; visitar doentes e presos. Acolher os peregrinos. Vestir os nus. A caridade é outra roupa que devemos nos revestir para ficar no salão da festa.
E por último, o perdão, a misericórdia. Tal como rezamos no Pai Nosso: “perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”. Agir com misericórdia com todas e todos. Jesus não disse que deveríamos perdoar alguma categoria de pessoas. Mas que deveríamos perdoar quem nos ofendesse.
Então, ao contemplarmos a cena dessa festa, pensemos nas nossas ações e com quais roupas estamos revestidos.

Deus nos abençoe.

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

O MILAGRE DE UNIR VIDAS ESQUARTEJADAS

Rio, 12 de outubro de 2017.

Por: Padre Gegê

Desejo  em chave simbólica, cara à psicologia jungiana, no   milagre de Aparecida ocorrido há 300 anos atrás, sublinhar uma ocorrência extremamente importante, simbolicamente pensada, para a psique pessoal e coletiva do Brasil que, desde sua origem, patrocina a matança sistemática e o esquartejamento  de variados modos da população indígena,  negra e empobrecida. 
 No milagre de Aparecida os pescadores unem o corpo quebrado da imagem, isto é, reunem o que fora partido - o corpo da Negra Mãe.  Tal ocorrência faz lembrar a mitologia sapiencial egípcia que narra o trabalho da divindade Isis que parte para unir o corpo esquartejado de seu amado Osiris, morto por seu próprio irmão, Seth.
Ao unir o corpo despedaçado de Osiris, Isis restitui a VIDA. 
Resumindo, tanto em Aparecida quanto no referido mito de Isis,  a VIDA segue dependente da união das partes despedaçadas.  Desse modo, de forma especial a comunidade negra (mas não só), pode tirar precisosa lição dessas duas ocorrências, qual seja: assumir o trabalho coletivo de resgatar nossa história esquartejada , fazendo memória do que somos e temos, isso passa por lutar pelo ensino da história da Africa e do Negro no Brasil, e também pela promoção do diálogo e união com todos os coletivos que lutam por um Brasil justo e democrático. Em especial,  em nossas favelas, corpos negros não cessam de tombar; copos quebrados pelo poder do Capital e vidas esquartejadas pelo descaso estatal.  
Temos,  pois, uma grande tarefa de reunir corpos sistematicamente quebrados; e esse trabalho passa, necessariamente, pela organização popular. Se historicamente no Brasil as vidas negras sempre foram, de diversos modos, esquartejadas,  também alquebradas foram no passado e são no presente as Comunidades de Terreiros. Quebrar,  partir e esquartejar,  nesse contexto, significa querer  impedir e apagar a VIDA,  aniquilar a história e apagar a memória.
É tempo de unir nossas forças, é hora de darmos as mãos,  independente de crença ou religião. 
O modo de viver-pensar ou o ethos-favela nos ensina numa cognição insubmissa, revolucionária e desconcertante quando diz "É NÓS POR NÓS!".
Essa frase ou proclamação de união tem valor e significado ético,  político, comunitario, religioso, social,  filosófico e  pedagógico. 
"É NÓS POR NÓS" -  isso é um hino, um sonho, uma forma de ser, pensar e agir: é o princípio ético de nosso quilombismo urbano!!
Urge que reunamos também nossos sonhos esquartejados,  nossas utopias desarticuladas e nossas vidas partidas. O tempo exige partida,  saída e despojamento; o tempo exige que flexibilizemos nossas posições rígidas e destronemos nossos egos inflados. Que ninguem fique de fora ou na comodidade do lar e também que o medo nao nos paralise. E que nenhum 
religioso se contente em salvar apenas o seu rebanho, pois Deus não faz distinção de pessoas. A propósito,  para Deus a dignidade humana vale mais que templos ou doutrinas. O trabalho é de todos e todas. O tempo é agora! Lá fora há corpos,  vidas e sonhos esquartejados... 
Nossa Senhora da Conceição Aparecida,   Rogai por Nós!

Padre GEGÊ (Manguinhos/Higienópolis).

"Fazei o que ele vos disser"

Evangelho de Jesus Cristo segundo João 2,1-11: Naquele tempo: 1Houve um casamento em Caná da Galiléia. A mãe de Jesus estava presente. 2Também Jesus e seus discípulos tinham ido convidados para o casamento. 3Como o vinho veio a faltar,  a mãe de Jesus lhe disse: "Eles não têm mais vinho". 4"Mulher, por que dizes isto a mim? Minha hora ainda não chegou." 5Sua mãe disse aos que estavam servindo: "Fazei o que ele vos disser". 6Estavam seis talhas de pedra colocadas aí para a purificação que os judeus costumam fazer. Em cada uma delas cabiam mais ou menos cem litros. 7Jesus disse aos que estavam servindo: "Enchei as talhas de água". Encheram-nas até a boca. 8Jesus disse: "Agora tirai e levai ao mestre-sala". E eles levaram. 9O mestre-sala experimentou a água, que se tinha transformado em vinho. Ele não sabia de onde vinha, mas os que estavam servindo sabiam, pois eram eles que tinham tirado a água. 10O mestre-sala chamou então o noivo e lhe disse: "Todo mundo serve primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho melhor até agora!" 11Este foi o início dos sinais de Jesus. Ele o realizou em Caná da Galiléia e manifestou a sua glória, e seus discípulos creram nele.
Hoje celebramos a Solenidade de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, simplesmente, Nossa Senhora Aparecida.
O texto apresentado para essa solenidade é o das bodas de Caná, onde Jesus iniciou sua atividade apostólica, segundo João, com o milagre da água convertida em vinho. Em cada época da vida, ao lermos as passagens do evangelho, uma parte se destaca mais. Nesse ano, chamou-me atenção quando Maria diz “fazei o que ele vos disser”.
Eu me perguntei, o que foi que Jesus disse que fizéssemos?
A primeira coisa foi o que registra João Evangelista, “eis que vos dou um mandamento, amai-vos uns aos outros”. Em seguida, Mateus coloca na boca de Jesus as seguintes palavras: “tive fome, me destes de comer. Estava com sede, me destes de beber. Estava nu e me vestistes. Estava doente e preso e fostes me visitar. Era peregrino e me acolhestes”.
Ainda em Mateus, lemos as bem-aventuranças. Somos chamados a mudar de vida, vivendo de um outro jeito. Construindo novas relações humanas e sociais. Fazendo nascer a “civilização do amor”. E continuou Jesus, “dai-lhes vós mesmos de comer”.
E mais, ao subir aos céus deu a ordem de que todos partissem para anunciar a Boa Nova a todas as nações, ensinando-as a observar tudo o que ele havia dito.
Hoje, diante de tantos sinais de mortes que se apresentam diante de nós (perda de direitos trabalhistas; perda de direitos previdenciários; retorno à fome de muitos pobres; perda de confiança na política e na economia; vendo terras indígenas sendo expropriadas; a Amazônia sendo vendida; corrupção; escravidão trabalhistas etc), Maria, mãe de Jesus diz, "Fazei o que ele vos disser". Aprendamos a ouvir a voz de Jesus que está nos evangelhos. Ouçamos o que ele nos pede. Façamos a sua vontade para ouvirmos “vinde benditos do meu pai”.  E lembremos, “nem todo aquele que diz Senhor, Senhor entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos céus”.

Nossa Senhora da Conceição Aparecida, rogai por nós!

terça-feira, 26 de setembro de 2017

Traidores do povo

Recebi de Javé a seguinte mensagem: «Criatura humana, profetize contra os pastores de Israel, dizendo: Assim diz o Senhor Javé: Ai dos pastores de Israel que são pastores de si mesmos! Não é do rebanho que os pastores deveriam cuidar? Vocês bebem o leite, vestem a lã, matam as ovelhas gordas, mas não cuidam do rebanho. Vocês não procuram fortalecer as ovelhas fracas, não dão remédio para as que estão doentes, não curam as que se machucaram, não trazem de volta as que se desgarraram e não procuram aquelas que se extraviaram. Pelo contrário, vocês dominam com violência e opressão. Por falta de pastor, minhas ovelhas se espalharam e se tornaram pasto de feras selvagens. Minhas ovelhas se espalharam e vagaram sem rumo pelos montes e morros. Minhas ovelhas se espalharam por toda a terra, e ninguém as procura para cuidar delas. Por isso, vocês, pastores, ouçam a palavra de Javé: Juro por minha vida - oráculo do Senhor Javé: Minhas ovelhas se tornaram presa fácil e servem de pasto para as feras selvagens. Elas não têm pastor, porque os meus pastores não se preocupam com o meu rebanho: ficam cuidando de si mesmos, em vez de cuidarem do meu rebanho. Por isso, pastores, ouçam a palavra de Javé! Assim diz o Senhor Javé: Vou me colocar contra os pastores. Vou pedir contas a eles sobre o meu rebanho, e não deixarei mais que eles cuidem do meu rebanho. Desse modo, os pastores não ficarão mais cuidando de si mesmos. Eu arrancarei minhas ovelhas da boca deles, e elas não servirão mais de pasto para eles». «Assim diz o Senhor Javé: Eu mesmo vou procurar as minhas ovelhas. Como o pastor conta o seu rebanho, quando está no meio de suas ovelhas que se haviam dispersado, eu também contarei as minhas ovelhas, e as reunirei de todos os lugares por onde se haviam dispersado, nos dias nebulosos e escuros. Eu as retirarei do meio dos povos e as reunirei de todas as regiões, e as trarei de volta para a sua própria terra. Aí, eu próprio cuidarei delas como pastor, nos montes de Israel, nos vales e baixadas do país. Vou levá-las para pastar nas melhores invernadas, e o seu curral ficará no mais alto dos montes de Israel. Aí, elas poderão repousar num curral bom, e terão pastos abundantes sobre os montes de Israel. Eu mesmo conduzirei as minhas ovelhas para o pasto e as farei repousar - oráculo do Senhor Javé. Procurarei aquela que se perder, trarei de volta aquela que se desgarrar, curarei a que se machucar, fortalecerei a que estiver fraca. Quanto à ovelha gorda e forte, eu a destruirei, pois cuidarei do meu rebanho conforme o direito». (Ez. 34,1-16).

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Buscarei minhas ovelhas de todos os lugares

A palavra do Senhor foi-me dirigida nestes termos: ”Filho do homem, profetiza contra os pastores de Israel!  Profetiza, dizendo-lhes: Assim fala o Senhor Deus aos pastores: Ai dos pastores de Israel, que se apascentam a si mesmos!  Não são os pastores que devem apascentar as ovelhas? Vós vos alimentais com o seu leite, vestis a sua lã e matais os animais gordos, mas não apascentais as ovelhas. Não fortalecesses a ovelha fraca, não curastes a ovelha doente, nem enfaixastes a ovelha ferida.  Não trouxesses de volta a ovelha extraviada, não procurasses a ovelha perdida; ao contrário, dominasses sobre elas com dureza e brutalidade. As ovelhas dispersaram-se por falta de pastor; tomando-se presa de todos os animais selvagens. Minhas ovelhas vaguearam sem rumo por todos os montes e colinas elevadas.  Dispersaram-se minhas ovelhas por toda a extensão do país, e ninguém perguntou por elas, nem as procurou.
Assim diz o Senhor Deus: Vede!  Eu mesmo vou procurar minhas ovelhas e tomar conta delas. Como o pastor toma conta do rebanho, de dia, quando se encontra no meio das ovelhas dispersas, assim vou cuidar de minhas ovelhas e vou resgatá-las de todos os lugares em que forem dispersadas num dia de nuvens e escuridão. Vou retirar minhas ovelhas do meio dos povos e recolhê-las do meio dos países para as conduzir à sua terra.  Vou apascentar as ovelhas sobre os montes de Israel, nos vales dós riachos e em todas as regiões habitáveis do país. Vou apascentá-las em boas pastagens e nos altos montes de Israel estará o seu abrigo.  Ali repousarão em prados verdejantes e pastarão em férteis pastagens sobre os montes de Israel. Eu mesmo vou apascentar as minhas ovelhas e fazê-las repousar - oráculo do Senhor Deus. Vou procurar a ovelha perdida, reconduzir a extraviada, enfaixar a da perna quebrada, fortalecer a doente, e vigiar a ovelha gorda e forte.  Vou apascentá-las conforme o direito.
Para apascentá-las farei surgir sobre elas um único pastor, o meu servo Davi: ele as apascentará e lhes servirá de pastor. Eu, o Senhor, serei o seu Deus e o meu servo Davi será príncipe entre eles.  Eu, o Senhor, falei. Farei com eles uma aliança de paz, farei desaparecer do país os animais ferozes, de modo que poderão morar em segurança no deserto e dormir nos bosques. Farei deles e dos arredores da minha colina uma bênção; farei cair chuva a seu tempo, chuva que será uma bênção. As árvores do campo produzirão fruto e a terra dará suas colheitas, e eles estarão em segurança no seu país.  Saberão que eu sou o Senhor, quando eu lhes quebrar as barras do jugo e os libertar da mão dos que os escravizam. Não mais servirão de pilhagem para as nações, e os animais selvagens não tomarão a devorá-los.  Morarão em segurança sem que ninguém os aterrorize. Farei germinar para eles plantações tão fabulosas que não haverá mais vítimas de fome no país, nem terão de suportar a injúria das nações. Assim saberão que eu, o Senhor, sou O Deus-com-eles, e eles o meu povo, a casa de Israel oráculo do Senhor Deus. E quanto a vós, minhas ovelhas, sois as ovelhas de minha pastagem, e eu sou o vosso Deus” oráculo do Senhor Deus. (Ezequiel 34,1-6.11-16.23-31)

domingo, 24 de setembro de 2017

“O senhor está perto da pessoa que o invoca”

Hoje nos deparamos com dois textos que falam do nosso “ser-humano”. Do que há de humano na própria humanidade.
O profeta Isaías (Is. 55,6-9) nos fala de um Deus que se deixa encontrar. Mas só quem se afasta de iniquidade, de praticar injustiças, de maquinações, pode encontrar a Deus, e o invocar com fé sincera.
Jesus nos fala de um “patrão”, de um dono de uma vinha. Este necessita de trabalhadores. O tempo da colheita chegou. Então, o Reino de Deus é comparado a essa vinha. Interessante é vermos Deus como o patrão; e Jesus o capaz que faz a contratação e paga cada um dos servidores.
Por outo lado, há um contrato de trabalho, onde se estipula o valor que será pago pelo serviço executado. Cada grupo de trabalhadores inicia o serviço num determinado horário. Mas Jesus deixa bem claro que o valor da atividade laboral será uma moeda de prata.
Uns chegaram pela madrugada, em torno das seis horas da manhã, ou quando sol começa a surgir. Há os que foram chamados às nove horas. Por volta da metade da manhã. E nos fala daquele que chegaram ao meio dia. E por fim, de trabalhadores que iniciam sua atividade pelo fim da tarde, um pouco antes de sol se por.
Lembremos que o combinado pelo serviço era de uma moeda de prata. Esse foi o trato inicial. Deus sempre age com justiça. A lógica divina difere da nossa lógica capitalista.
Começa o acerto das contas dos trabalhadores. O “patrão” começou a pagar pelos últimos. Aqueles que, segundo texto, trabalharam apenas uma hora. Receberam uma moeda de prata, tal como aqueles que iniciaram sua atividade laborial na madrugada. Vendo aquilo, os primeiros acharam que receberiam mais, pois se os últimos contratados receberam uma moeda de prata e só trabalharam uma hora, os primeiros acharam que deveriam ganhar mais. Essa é a nossa lógica capitalista de ver o mundo. Mas Jesus está nos educando para olhar nossa realidade através da lógica divina e não humana. Pois a lógica humana é mesquinha, injusta e invejosa.
Lembremos que há um patrão que contrata os serviços. Há um “contrato” de trabalho onde ficou acertado o valor da diária. Existem trabalhadores convocados para cada hora do dia. E que o parâmetro do pagamento é de uma moeda de prata.
Por outro lado, o dinheiro pertence ao dono da vinha, como a própria vinha. Quem estipula o valor a ser pago é o dono. Ele tem o valor máximo a ser pago, uma moeda de prata. Mensuramos nossa atividade de trabalho pelo tempo trabalhado, e não pela qualidade do trabalho. Quem disse que quem trabalha mais tempo tem uma qualidade melhor? Nós medimos o tempo e o valoramos. Deus “mede” as pessoas e as relações humanas e divinas que elas produzem.
Desde o livro do Levítico, Deus havia acordado o valor e a forma de trabalho. O patrão não deveria reter o valor da diária até o dia seguinte. O pagamento deveria ser justo.
O que vemos hoje, é como devemos prestar atenção no nosso serviço para Deus. Deus não se importa com o tempo que estamos na Igreja. Não! Deus quer que façamos de nossas relações sociais uma modelo de família, onde um pai-mãe trata seus filhos de forma igual, não importa a idade. Do mais velho ao mais novo, todos tem o mesmo direito. Ninguém está acima de ninguém. Se assim acontece em nossas famílias e em nossas casas, porque não agirmos do mesmo modo nas coisas de Deus? Na Igreja de Deus? No grupo, na pastoral, no ministério? Antiguidade não é posto. Formação acadêmica não garante privilégios. Jesus disse que quem quisesse ser o maior fosse o servidor de todos. Aquele/a que deseja ser o maior na comunidade deverá ser o/a que está sempre disponível a servir. Aquele/a que está sempre pronto para a cruz. Aquele/a aquela que caminha para o calvário. Que aceita a paixão. Pois sabe que é pela cruz que se chega à ressurreição. Não existe entrada no Reino sem cruz. Paulo disse, “Só uma coisa importa: vivei à altura do Evangelho de Cristo” (Fl 1,27a).
Aproximemo-nos de Deus enquanto há tempo, enquanto ele se deixa encontrar. Façamos de nossas vidas uma ação de graças constante. Revistam-nos do Evangelho. Vive ou morrer seja para nós um mero detalhe.
“O senhor está perto da pessoa que o invoca”, diz o salmista. Invoquemos o Senhor nos dias de angústia para que possamos suportar a Dor. Invoquemos o Senhor no dia da alegria para darmos graças pelas consolações recebidas. Vivos para Deus, e mortos para as coisas do mundo sejamos sempre gratos a Deus que está ao nosso lado.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

“Quem não está contra nós, está ao nosso favor”

Mc. 9,38-40: João disse a Jesus: “Mestre, vimos um homem que expulsa demônios em teu nome. Mas nós lhe proibimos, porque ele não nos segue”. Jesus disse: “Não lhe proíbam, pois ninguém faz um milagre em meu nome e depois pode falar mal de mim. Quem não está contra nós, está ao nosso favor”.
Esse texto sempre me chamou a atenção. Por um lado, os discípulos queriam que somente aqueles que seguissem a Jesus tivessem a autoridade de expulsar demônios. Por outro, Jesus abre a oportunidade para que outras pessoas, mesmo de fora do grupo, mas que acreditam nele possam fazer as mesmas coisas que os discípulos.
Muitas vezes, achamos que Deus nos criou para que vivamos presos numa caixa fechada, onde não se pode fazer nada de diferente. Onde não vemos outras caixas, outras possibilidades. Outros jeitos de ser. Outras formas de vida que brota do próprio Deus, fonte da vida.
Em outra oportunidade, Jesus havia dito a Samaritana, “Mas está chegando a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores vão adorar o Pai em espírito e verdade. Porque são estes os adoradores que o Pai procura. 24 Deus é espírito, e aqueles que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade” (Jo. 4,23-24).
Em Jesus, Deus não se fecha em si mesmo. Não se submete a leis que nos afastam dele. As leis de Deus nos geram vida, e “vida em abundância”. Elas tratam de nossa relação conosco mesmo, com os outros, e com o próprio Deus. Deus não se fecha em si. Deus quis se dar, pois Deus é vida. Deus doa vida. Deus se deu para cada um de nós quando morreu na cruz.
At. 11,7-9: “Depois ouvi uma voz que me dizia: ‘Levante-se, Pedro, mate e coma’. Eu respondi: ‘De modo nenhum, Senhor! Porque jamais coisa profana e impura entrou na minha boca’. A voz me disse pela segunda vez: ‘Não chame de impuro o que Deus purificou’”.
Nos Atos dos Apóstolos, Pedro tem a experiência de que Deus purifica as pessoas. Purifica as relações sociais. Transforma a vida, principalmente a vida daquele que assumem a direção, o pastoreio, que vão à frente do grupo, da comunidade. Apontam a direção.
A Palavra de Deus nos ensina as relações de tolerância, de respeito. De busca de compreensão do outro. De procurar ver a vida do outro com o valor devido.

Com tolerância. Sem raiva ou rancor. Sem ódio no coração poderemos criar uma nova sociedade, uma nova relação baseada na fraternidade, na solidariedade, na liberdade.

“Senhor, quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim”?

Esse é o texto mais difícil de ser pregado. Pedro expressa aquilo que vai no coração humano, “olho por olho, dente por dente”. Muitas vezes, a natureza humana fala mais alto: o egoísmo, o fundamentalismo, a mesquinhez, a raiva, o ódio. Pedro expressou nessa pergunta aquilo que se instalou no coração humano. O Perdão! Quantas vezes demos perdoar. No coração de Caim contra seu irmão Abel. A Sagrada Escritura está repleta de histórias sobre a “raiva” que os seres humanos nutrem por outro ser humano.
Por outro lado, os profetas, juízes e reis do Primeiro Testamento, sempre destacaram o amor de Deus pela humanidade. Mostram o plano divino para o retorno ao paraíso.
João, na sua Primeira Carta, diz, “Deus é amor”. E, certa vez ouvi, “Deus não pode não amar”. E se somos feitos a imagem e semelhança de Deus, não podemos não amar também. Nosso exemplo máximo de amor é Jesus Cristo. Aquele doou-se a si mesmo. Que deu seu corpo e seu sangue em resgate dos nossos pecados. Que deixou a “ordem” de nos amarmos uns aos outros, para que todos possam conhecer a Deus. E ainda, que “ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus irmãos”.
Perdoar não tem limites. Deus é infinito em sua misericórdia. Deus nos perdoa. E se trazemos em nós parte de Deus (fomos criados a sua imagem e semelhança), devemos amar também. E amar de forma incondicional.

Se “o Senhor é bondoso, compassivo e carinhoso” tenhamos em nós essas características. 

sábado, 16 de setembro de 2017

Oficina dos Escritos Espirituais de Santo Inácio de Loyola

Hoje participei de uma Oficina para os Escritos Espirituais de Santo Inácio de Loyola.
Saber registrar o que Deus nos fala, e quais os nossos sentimentos em relação à escuta da voz de Deus, é um dos caminhos para encontrarmos a vontade de Deus em nossa vida.
Como exercício proposto, nos foi pedido que utilizássemos o texto de Lc. 22,7-20 para rezarmos e deixarmos registrado aquilo que Deus nos comunicou.
Para saber, o texto refere-se à última ceia judaica de Jesus, e a instituição da Eucaristia cristã.
O que me marcou neste momento foi a palavra "repartiu". Jesus repartiu o pão. Deu-se em comida. O pão que é o corpo, é repartido. É dado por nós. É colocado a serviço e em missão.
Por outro lado, a vida vem do sangue. "Sangue é vida. E do sangue, nasce a "nova aliança"; o pacto de sangue entre Deus e a humanidade. Dar o sangue significa resgatar a divindade escondida na humanidade.
Jesus manda que seus discípulos façam memória daquele momento. Devemos recordar, reviver o gesto de Jesus. "Fazer memória" é tornar a realidade o mistério da Encarnação. Ao comer do "corpo"; ao beber do "sangue", eu me doo refazendo a Nova Aliança em minha vida? Meu corpo e meu sangue, eu os reparto para que haja, e se faça, vida, e "vida em abundância"?
No evangelho de João, ao falar sobre o lava-pés, a doação que brota da Eucaristia, Jesus diz aos discípulos, "vós deveis fazer o mesmo"!

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

"Eis que faço nova todas as coisas"

De instrumento de tortura e morte, a objeto de salvação.
A cruz era o elemento mais cruel de tortura e morte criada pelos romanos. O apedrejamento era um costume judaico. Cada povo, cada cultura, cria seus instrumentos de morte par dar vasão ao não entendimento daquilo que nos é diferente.
Para a sociedade do tempo de Jesus, a cruz significava o lugar do abandono de Deus: “meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes”. Essas foram as palavras de Jesus. A dor. A perda de sangue. A rejeição. A zombaria. Foram tão fortes, que o próprio filho não conseguia ver o Pai. Um silêncio divino dentro do mais profundo do ser. Dentro de quem sempre colocou sua vida para Deus. Um silêncio. Um silêncio divino que incomoda a essência humana, pois somos partes de Deus. Somos criados a sua imagem e semelhança.
A morte na cruz era destinada aos piores bandidos do tempo de Jesus. E principalmente, para aqueles que se demostravam contra o império romano.
Interessante observar que tudo o que Jesus toca se santifica. A cruz de Cristo tornou-se elemento de salvação. Jesus fez de sua morte nossa passagem para o Reino de Deus. Não se chega ao Reino sem a cruz. “Pegue a sua cruz e me siga”. A cada um de nós, Deus nos deu uma cruz. Ou um “espinho”, como disse são Paulo. A cruz nos faz lembrar a nossa humanidade. A cruz nos remete a nossa dependência de Deus. A cruz tira de nós a nossa soberba, autossuficiência. Nos tornas impotente.
Existem duas formas de encarar a cruz. A primeira, é murmurando. Achando-se mais santos de todos os mortais, que não mereça a cruz. E a outra forma, é pegando a própria cruz e seguindo Jesus. É sendo sinal de salvação no meio do mundo. E dando testemunho de que a graça de Deus supera todas as dificuldades.
Deus se colocou na cruz para que pudesse passar por todos os sofrimentos humanos. Deus se colocou na cruz para que pudesse compreender a dor humana. Deus se colocou na cruz para nos mostrar que tudo pertence a Deus. Que Deus está na ordem de todas as coisas. E que quando sabemos ver Deus no sofrimento, na dor, no desespero, ele se revela, “ainda hoje estará comigo no paraíso”.
Ao ser levantado na cruz, Jesus abriu as portas do Reino dos Céus. Se quisermos ir e entrar no Reino dos Céus, essa é a chave, a cruz. Todos os que assumem a sua cruz garantem a entrada no Reino de Deus. A vida eterna passa pela cruz e pela fé em Jesus pregado na cruz. Ao passar pela cruz, Jesus gerou vida, e vida em abundância.
Oremos: “Ó Deus, que para salvar a todos despusestes que o vosso Filho morresse na cruz, a nós que conhecemos na terra este mistério, dai-nos colher no céu os frutos da redenção”.

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

"Cristo é tudo em todos"


“O Senhor é muito bom para com todos”
“Não é mole não. Rapadura é doce, mas não é mole não”. Acho interessante esse ditado popular. Quem disse que para ser doce precisa ser mole? E tem outro que trata da perseverança: “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”!
Olhando as leituras de hoje, somos chamados a mudarmos de vida. E nos revestirmos de Cristo. A nos tornarmos mulheres e homens de um novo tempo. Forjar uma nova civilização, baseada no amor, no respeito, no perdão. Como disse o Papa Paulo VI, criar a “civilização do amor”.
Para construir essa nova “civilização” é preciso nos revestirmos das “coisas do alto” (Cl 3,1). Devemos fazer morrer em nós o que pertence á terra, a saber, “imoralidade, impureza, paixão, maus desejos, cobiças e idolatria” (Cl 3,5-6). Pois essas coisas não agradam a Deus.
Aqueles e aquelas que buscam fazer a vontade de Deus, que estão no caminho de um bom propósito. Que querem construir novas relações sociais, devem abandonar a “ira, irritação, maldade, blasfêmia, palavras indecentes” (Cl 9,8); e “não mentir uns aos outros” (Cl. 3,9). Esses são os jeitos que o homem velho agia em nós. Jesus Cristo nos remiu de tudo isso.
Assim, devemos viver uma vida baseada nas bem-aventuranças. Aprender com ele que a pobreza é a porta para a entrada no Reino de Deus. Que a fome será completamente saciada na glória eterna. Fome de pão e de palavra. Que os que choram não o fazem em vão. Que ser tratado com ódio nos torna semelhantes ao Cristo da paixão. Jesus nos dá uma nova perspectiva de vida. Nos faz ter um olhar mais à frente. “A quem iremos, Senhor? Só tu tens palavras de vida eterna”.
Por outro lado, Jesus nos adverte para tomarmos cuidado. Pois aqueles que, neste mundo, tem riquezas, que se fartam de comer sem se preocupar com os famintos, aqueles que vivem rindo na riqueza, e que são elogiados pela fortuna que tem, devem tomar cuidado. Sofrerão quando da passagem para o Reino. Não herdarão o reino. Não entrarão no Reino de Deus.
A palavra de hoje é dura. Muita dura. Mas pode se tornar doce, muito doce. Basta sabermos a vida que queremos no futuro. Consolação ou desolação?
Deixemo-nos moldar, cotidianamente, pela Palavra de Deus que vai nos transformando em mulheres e homens novos, revestidos da glória de Deus. Construtores da Civilização do Amor.
(fonte: Lc. 6,20-26. E Cl. 3,1-11)

terça-feira, 12 de setembro de 2017

"Vieram para ouvir Jesus"


Vemos três atitudes de Jesus: oração noturna; escolha dos 12; pregação e cura de “muitos”.
A oração. É o momento privilegiado de encontro com Deus. Não aquela oração que repete muitas palavras. Mas a oração silenciosa que se dá no coração e na vida. Distanciado dos “barulhos” do mundo. Das agitações. Um colocar-se a parte.
Para os judeus, a montanha sempre será esse lugar. Foi na montanha que Moisés recebeu as Tábuas da Lei. Foi na montanha que Moisés se instruía com Deus. Deus se revela na montanha. Lugar distante de tudo e de todos. Cada um de nós devemos buscar nossa montanha para nosso encontro pessoal com Deus.
Jesus passa a noite toda em oração. A noite é o momento onde todos os nossos fantasmas aparecem. A noite é o momento do abandono. Da ausência de luz. Estar em oração a noite significa dizer que Deus ilumina até os momentos de tristeza, de desilusão, de decepção, de angústia. É colocar nas mãos de Deus tudo aquilo que faz parte do nosso sofrimento humano. É o momento do entendimento de que Deus está no comando, no controle, na direção de nossas vidas.
Passar a noite em oração é colocar todo o pensamento em Deus. Todo querer. Toda vontade. É submeter-se àquilo que o Pai espera de nós.
A oração precede toda tomada de decisão importante. Infelizmente, perdemos isso em nossos tempos. As decisões mais importantes de nossa vida devem ser tomadas nos momentos de consolação, de alegria, de esperança, de fé. Nunca na agonia, na tristeza, na falta de fé, nem na falta de esperança. Com certeza, ao deixarmos Deus e a oração de lado, nossas decisões tornam-se vazias e estéreis. Frustradas. Nos levando ao desânimo.
Após a oração, Jesus chama seus 12 apóstolos. Mas Jesus não chama-os para ficarem na montanha. Jesus chama seus apóstolos para estarem com eles no apostolado, na missão, na pregação da Palavra e na cura. O lugar do apóstolo não é fica refugiado na montanha. A montanha é para se abastecer de Deus e voltar para a planície.
Na planície se dá a missão. O encontro com as pessoas. Com seus problemas, com seus sofrimentos, com suas angústias. Com suas doenças. Com seus demônios que impedem de ver Deus verdadeiramente, tal como ele é. É na planície que se deforma a imagem de Deus. É na planície que está a árvore da vida que não deve ser tocada. É na planície que está aqueles e aquelas que devem ser curados das enfermidades, e onde deve ser exorcizado todo espírito mau que divide a comunidade, que afasta as pessoas, que discrimina, que acusa.
Na planície o encontro. Mas não é um encontro casual; não é um encontro qualquer. É um encontro para se ouvir a palavra de Jesus. É a palavra que transforma vidas. É a palavra que cura. É a palavra que exorciza os espíritos angustiados.
Hoje somos chamados a sermos contemplativos, mulheres e homens de oração. Somos chamados e escolhidos para sermos missionários nas planícies de nossa vida cotidiana. Anunciar a palavra e provocar a cura e o exorcismo em todos aqueles e aquelas que veem ao nosso encontro.

Encerro com a palavra que diz “a multidão procurava tocar em Jesus, porque uma força saia dele”. Portanto, somos portadores de uma força que cura e liberta. Vivamos nossa missão. (fonte: Lc. 6,12-19).

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

“O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal”?

Temos diante de nós um breve relato muito revelador da pessoa e da personalidade de Jesus.
Lucas nos mostra que o fato ocorreu num dia de Sábado, no shabat. Dia em que os judeus se recolhem e nada podem fazer. Muitos dos atritos de Jesus com os fariseus, mestres da lei e doutores se deu em dia de Sábado. A observância máxima da lei. Situa o dia: Sábado.
Em seguida, o evangelista nos mostra que Jesus está na Sinagoga, local de culto, de oração. E que Jesus não está aí numa atitude passiva, mas tem voz ativa nesta Sinagoga. O autor revela que Jesus “começou a ensinar”. Ensinar, etimologicamente, significa “colocar sinal, marcar”. Para Jesus, ensinar significa colocar no coração dos seus ouvintes aquilo que Deus-Pai quer que seja feito. Não sabemos o que Jesus estava ensinando. O evangelista não nos revela. Mas neste caso, não faz a menor importância. Mas podemos supor que Jesus estivesse falando sobre o bem e o mal. Como fomos criados para a bondade, pois fomos feitos à imagem e semelhança de Deus e da Trindade, que é bondade, que é amor. Mas que o coração do homem se fechou à graça de Deus a partir do momento que decidiu, em seu coração, não acatar a lei de não tocar, nem comer, o fruto da árvore do meio do jardim. A partir de então o próprio ser humano começou a criar leis que o escravizavam, e não libertavam.
Aparece, então, um homem com a mão ressequida. Uma mão atrofiada. Que pela aparência, não serviria para nada. Era o caos. O nada. O princípio. O mundo sem forma antes da criação.
Aparece um homem com mão ressequida. Era Sábado. Estavam na Sinagoga. Jesus ensinava. Todos acreditavam que Jesus nada faria. Mas diante dele está um homem que precisa de misericórdia de Deus. Que necessita do acolhimento de Jesus. Que precisa restaurar sua vida social e religiosa.
Toda a comunidade parou para ver a reação de Jesus. Se ele curasse o homem, estaria indo contra a lei. Se não o curasse, estaria indo contra suas palavras de fazer o bem. Então, como agir?
Jesus sabia o que ia no pensamento deles. Os conhecia bem. Sabiam que eram mais inquisidores do que homens de fé e de Deus, apesar de estarem na Igreja, ou seja, na sinagoga.
Conhecendo o que pensavam, ele vem com a pergunta fundamental, “O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal”? Quer dizer, Deus poderia deixar de salvar uma vida porque é dia de Sábado? Deus deixaria de fazer o bem porque a Lei manda assim? Deus deixaria de curar alguém, de trazer de volta à vida, porque é Sábado?
O que é permitido? Fazer o bem ou o mal? Se “Deus é amor”, só podemos fazer o bem, pois somos feitos à “sua imagem e semelhança”. Jesus é a imagem de Deus, pois é Deus. Mas, também é homem. “Verdadeiramente Deus, Verdadeiramente Homem”. São João Paulo II disse que Jesus era o “rosto humano de Deus, e o rosto divino do Homem”.
Num gesto simples, Jesus manda o homem levantar a mão. Ele obedece. A mão fica curada. Levantar a mão para que, curada, possa louvar e agradecer a Deus pelo dom da vida. Pela graça recebida. Pela sua reinserção na vida cotidiana da sociedade. Ele passou a estar inserido em todas as atividades da vida. Inclusive trabalhar para ganhar o pão de cada dia.
Os legalistas, os fundamentalistas ficaram com raiva. Ou melhor, com “muita raiva”. Quem está afastado de Deus, e vive a religião da lei, não compreende o que é fazer o bem. O que é romper com o legal para salvar uma vida.
São Paulo disse aos Romanos, “O amor não faz nenhum mal contra o próximo. Portanto, o amor é o cumprimento perfeito da Lei” (Rm 13,10).
Queres ser perfeito, “vende tudo o que tens, dá aos pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois vem se segue-me” (Mt. 19,21).

Não deixe que a lei sufoque o seu lado bom.
(texto de referência, Lucas 6,6-11)