domingo, 25 de setembro de 2016

"Chamado Lázaro"

Lucas 16,19-31: Naquele tempo, Jesus disse aos fariseus: 19'Havia um homem rico, que se vestia com roupas finas e elegantes e fazia festas esplêndidas todos os dias. 20Um pobre, chamado Lázaro, cheio de feridas, estava no chão à porta do rico. 21Ele queria matar a fome com as sobras que caíam da mesa do rico. E, além disso, vinham os cachorros lamber suas feridas. 22Quando o pobre morreu, os anjos levaram-no para junto de Abraão. Morreu também o rico e foi enterrado. 23Na região dos mortos, no meio dos tormentos, o rico levantou os olhos e viu de longe a Abraão, com Lázaro ao seu lado. 24Então gritou: 'Pai Abraão, tem piedade de mim! Manda Lázaro molhar a ponta do dedo para me refrescar a língua, porque sofro muito nestas chamas'. 25Mas Abraão respondeu: 'Filho, lembra-te que tu recebeste teus bens durante a vida e Lázaro, por sua vez, os males. Agora, porém, ele encontra aqui consolo e tu és atormentado. 26E, além disso, há um grande abismo entre nós: por mais que alguém desejasse, não poderia passar daqui para junto de vós, e nem os daí poderiam atravessar até nós'. 27O rico insistiu: 'Pai, eu te suplico, manda Lázaro à casa do meu pai, 28porque eu tenho cinco irmãos. Manda preveni-los, para que não venham também eles para este lugar de tormento'. 29Mas Abraão respondeu: 'Eles têm Moisés e os Profetas, que os escutem!' 30O rico insistiu: 'Não, Pai Abraão, mas se um dos mortos for até eles, certamente vão se converter'. 31Mas Abraão lhe disse: `Se não escutam a Moisés, nem aos Profetas, eles não acreditarão, mesmo que alguém ressuscite dos mortos'.'

Essa já é uma parábola conhecida de todos. Mas vamos lançar um novo olhar sobre a história contada por Jesus.
A história está no contexto das chamadas Parábolas da Misericórdia. Dessa vez, observamos que se fala de salvação e condenação. Podemos traçar um paralelo entre a descrição do julgamento, em Mateus 25,31-46, e esta parábola.
Vejamos. Em Mateus, Jesus fala de pessoas com fome, com sede, despidos, sem lugar para morar, prisioneiros, doentes. E que todos aqueles que suprirem as necessidades físicas do outro, herdarão o Reino dos Céus.
Na parábola de hoje identificamos alguns desses elementos. Inicialmente, Lázaro é descrito como um homem coberto de feridas, doente. Desprovido de lar, vivia na porta do rico, na rua, jogado ao relento. Passava fome, queria comer as migalhas que caiam da mesa do rico. Prisioneiro de sua condição social de miserável. Nesta vida, a única companhia que tinha era do cachorro, que para lhe aliviar um pouco do sofrimento, lambia as feridas.
O rico tinha diante de si alguém que carecia de misericórdia. Deus colocara em sua porta alguém que necessitava de sua ajuda. Além disso, Moisés e os profetas já haviam alertado para isso. Pela sua condição social, o rico deveria conhecer a escritura. Em Ezequiel 16,49 lemos: “Olha, este foi o delito de Sodoma, soberba, fartura de pão (...) mas não deu a mão ao desgraçado e ao pobre”. Em várias outras passagens, Amós 6,4-6, Sabedoria 2, Isaías 22,13, vemos que o “pecado consiste em entregar-se à boa vida sem preocupar-se com os necessitados”.
Após descrever a situação dos dois, o evangelista nos coloca diante do juízo final. Diz-nos que os dois morrem. A diferença se dá no tratamento. Lázaro é levado aos céus pelos anjos, para junto de Abraão. E o rico encaminhado diretamente para a sepultura. Para o esquecimento. Para a morte eterna.
Diante deste fato, observamos que é possível que aqueles que estão na condenação observam os que gozam da alegria eterna junto a Deus, neste caso, Abraão. Entretanto, apesar de os olhos contemplarem, não existe a possibilidade de se passar de um lugar para o outro. Cai em si o rico. O pobre era a porta de entrada para o reino de Deus. A assistência social daria ao rico a possibilidade de entrar no reino. Mas ele ignora aquele que carecia de sua ajuda e misericórdia. Mas, mesmo ainda estando na agonia, pede por si. Quer um pouco de água para lhe molhar os lábios. Diante da resposta negativa, e vivendo neste sofrimento eterno, lembra-se dos irmãos. E pede a Abraão que lhe envie Lázaro para que fale dos sofrimentos. Então, Abraão diz que se não ouvem os profetas e Moisés, não acreditarão nem mesmo que alguém volte dos mortos.
Hoje Deus nos abre uma oportunidade para olharmos para a nossa vida. Como estamos vivendo a misericórdia para com os pobres e miseráveis? Preocupamo-nos com nossas riquezas, ou colocamos tudo a serviço de quem precisa? Alimentamos os famintos? Vestimos os nus? Visitamos os doentes e encarcerados? Acolhemos os que carecem de habitação? Quem nós escolhemos para ocupar os cargos políticos? Pessoas que estão preocupadas em amenizar o sofrimento alheio, ou aqueles que roubam o dinheiro público? Tornamo-nos responsáveis pela corrupção que nos cerca, pois somos nós que os escolhemos.
Aproveitamos o momento político que estamos vivendo. Façamos uma revisão dos candidatos que vamos escolher. Lembremos de tudo o que aconteceu com esse rico que negligenciou a assistência ao pobre.

Oremos: Ó Deus, que mostrais vosso poder sobretudo no perdão e na misericórdia, derramai sempre em nós a vossa graça, para que, caminhando ao encontro das vossas promessas, alcancemos os bens que nos reservais. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

“Quero misericórdia e não sacrifício”

Festa de São Mateus
"Partindo dali, Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado na coletoria de impostos, e disse-lhe: ‘Segue-me!’ Ele se levantou e seguiu a Jesus. Enquanto Jesus estava à mesa, em casa de Mateus, vieram muitos cobradores de impostos e pecadores e sentaram-se à mesa com Jesus e seus discípulos.  Alguns fariseus viram isso e perguntaram aos discípulos: 'Por que vosso mestre come com os cobradores de impostos e pecadores?' Jesus ouviu a pergunta e respondeu: 'Aqueles que têm saúde não precisam de médico, mas sim os doentes. Aprendei, pois, o que significa: ‘Quero misericórdia e não sacrifício’. De fato, eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores'. (Mt.9,9-13)
Texto oportuno para os nossos dias. Vocação de Mateus.
O apóstolo está na coletoria de imposto. Lugar onde a corrupção era a palavra mais forte. Ser corrupto era a coisa mais natural para quem exercia aquele serviço. Os fariseus, e doutores da lei, não gostavam dos coletores de impostos. Estes estavam a serviço do império romano. Além disso, os zelotas (Jesus teve um apóstolo zelota, Simão, o zelota. Lc. 6,15), grupo radical, que defendia uma revolta armada contra Roma, também não gostavam dos cobradores de impostos.
Mateus, provavelmente, já conhecia Jesus. Deveria ter ouvido alguma de suas pregações. Ou, era um ouvinte assíduo. Jesus sabia quem era Mateus. Já deveria ter visto ele na coletoria de impostos várias vezes. Quem sabe, acompanhou Maria no pagamento de algum tributo. Ou ele mesmo deve ter ido pagar o imposto (”dai a César o que é de Cesar, e a Deus o que é de Deus”).
Num breve chamado, ‘segue-me’, Jesus diz, tenho uma nova vida para lhe dar. Tenho um reino para te oferecer. Tenho muito mais do que essas migalhas que você ganha e que rouba das pessoas. Tenho um sentido para sua vida. Portanto, “segue-me”! E o texto diz que “ele se levantou e seguiu a Jesus”.
Jesus disse: “se alguém me ama, guarda a minha palavra, e meu Pai o amará. Eu e meu Pai viremos e faremos nele a nossa morada” (Jo. 14,23). E foi isso que fez Mateus. Ao guardar a palavra de Jesus, ao aceitar o convite do senhor, Jesus vai à casa dele para fazer morada. E quem faz morada, faz refeição. E quem faz refeição partilha da mesma sorte. Mas neste caso, aos olhos do mundo, era Jesus que começava a fazer parte da sorte pecadora de Mateus. Jesus sabia da repercussão de seu ato. Jesus sabia que aquele gesto, aquele ato, iria causar espanto dos justos nas redes sócias do seu tempo. Se fosse hoje, estaria no facebook, no twitter, no whatsapp. Jesus seria acusado de andar com quem se diz que não presta. Um herege. Que nunca leu os documentos da Igreja.
Jesus não tinha tempo a perder com essas “fofocas midiáticas”. A sua resposta chama logo à consciência de quem precisa evangelizar de verdade. “Aprendei, pois, o que significa: Quero misericórdia e não sacrifício” (Os. 6,6). E continuou, “eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores”, pois, os “que têm saúde não precisam de médico, mas sim os doentes”.
Hoje vivemos numa sociedade doente que precisa ouvir a palavra de Misericórdia. Devemos pensar em nossas atitudes acusatórias. Em nome de um legalismo religioso, deixamos de anunciar a Palavra de Deus, de pregar, de viver. Nos prendemos a rituais que só tornam esvaziados de misericórdia, de caridade, de amor.
Antes de apontar o dedo. Antes de acusar. Reflita. Anunciei a Palavra? Vivi a misericórdia? Caminho com os pecadores para lhes mostrar a possibilidade de um Reino que vai além das aparências?

Por intercessão de São Mateus, deixemos de lado a coletoria de impostos, e sigamos Jesus vivendo a misericórdia.

domingo, 18 de setembro de 2016

“Vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Lc. 16,13d).

Vigésimo quinto domingo do tempo comum. Ano C. Evangelho de Lucas, o mais voltado a misericórdia e à caridade.
Abrimos a Liturgia da Palavra com a profecia de Amós. O profeta faz um alerta aos que maltratam os humildes, os pobres, aqueles que estão desprovidos de dignidade humana. Essa é uma característica dos profetas, denunciar o sofrimento dos pobres, e fazer os oráculos contra os que são detentores de riquezas nesse mundo, e colocam em seu dinheiro toda a confiança, desprezando o pobre.
“E o senhor elogiou o administrador desonesto, porque ele agiu com esperteza” (Lc. 16,8). Que senhor é esse? Jesus ou o patrão? Não nos importa. O que vale é refletir sobre a esperteza. Hoje, em nosso país, vivemos uma onda de “delações premiadas”. Muitas vezes, aplaudimos. Mas, esquecemos que corrupto e corruptor cometeram o mesmo crime: corrupção. Os dois devem ser punidos na mesma intensidade. Um não existe sem o outro. Os dois cometem crime. Só que um resolve baixar o valor da dívida, “delação”. Ser esperto é livrar-se da condenação.
Em seguida, Jesus faz uma ironia (é que muitas vezes não queremos ver ironias nas falas de Jesus. Existe uma outra clássica, “sepulcros caiados). “Usai o dinheiro injusto para fazer amigos, pois, quando acabar, eles vos receberão nas moradas eternas”. Pura ironia. Só achamos que a morada eterna é o Reino dos Céus, Reino de Deus. Não! Da mesma forma que há a salvação eterna; existe a perdição (danação) eterna. E para lá vão os corruptos, adúlteros, malfeitores, os que desviam dinheiro público, os que pregam e defendem a pena de morte e o aborto. Jesus ponta que o caminho é estar sempre alerta!
Em seguida, Jesus nos exorta a sermos justos com o que não nos pertence, como fez Amós. “Se vós não sois fiéis no dinheiro injusto, quem vos confiará o verdadeiro bem”? Não roubar. Não achar que “bandido bom é bandido morto”. Bandido bom é aquele que se converte. Temos dois exemplos clássicos, Mateus e Zaqueu. Não somos autores da vida. Só Deus pode tirar. Há um ditado sobre isso, “Deus põe, Deus dispõe”. Não podemos aceitar como normal pessoas públicas que agridem pessoas mais fracas. Que desdenha do outro. Que menospreza o trabalhador. Que busca se enriquecer com os bens públicos.
Por último, Jesus nos alerta, “vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro”. Cada um tem suas exigências. Um gera vida, solidariedade, misericórdia. O outro é responsável pela morte do trabalhador, do pobre. O dinheiro é incompatível com a fé. Os ricos colocam no dinheiro toda a sua esperança. Acham que podem comprar até o que é divino. Lembra-se do Rico e do pobre Lázaro?
Há um canto que diz, “nosso Deus fica ao lado dos pobres, colhendo o que sobrou”. E é verdade. O salmista diz, “Levanta da poeira o indigente, e do lixo ele retira o pobrezinho, para fazê-lo assentar-se com os nobres...”.

Oremos pela Igreja, pela nossa comunidade, e por cada um de nós a fim de possamos aprender que as riquezas materiais não sejam o valor último a orientar a vida humana. E para que os que são eleitos que deixem-se imbuir dos ensinamentos de Cristo e socorram os mais humildes e sofredores; e por nós, para que saibamos cada vez mais nos desapegar dos bens materiais e testemunhar um mundo de fraternidade, justiça, paz e fé.

“Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo. 14,6b)

O título desta mensagem serve para refletir sobre a questão do aborto. Em qualquer circunstância da vida, o cristão deve ser contra toda tentativa de se tirar a vida de quem quer que seja.
Ao se apresentar como Caminho, Jesus nos chama a contemplar sua vida, sua palavra, e suas ações. Sempre apontando uma saída para qualquer tipo de violência, seja ela física ou moral.
Ao se proclamar sendo a Verdade, ele nos apresenta a única possibilidade de se superar toda e qualquer ação violenta. Se colocamos nossas verdades na Verdade que é Jesus, toda forma de violência se torna vazia. Jesus é a Verdade que liberta de toda violência, seja contra a mulher, seja contra os que transgridem as leis, sejam contra aqueles que fazem opções sexuais distintas. Aceitar Jesus como Verdade, é aceitar a verdade que todos somos irmãos e irmãs.
Ao se proclamar Vida, ele se declara Deus, pois só Deus é autor da vida. A vida surge do sopro. Deus dá o sopro da vida, “soprou alento de vida em seu nariz” (Gn 2,7b). Cria o homem à sua imagem e semelhança (Gn 1,26). São João diz que tudo foi feito por meio da Palavra, e “sem ela nada existiu de tudo o que existe” (Jo. 1,3.). Jesus é autor, junto com o Pai, da vida; e de toda forma de vida. Deus é Deus da vida, dos vivos (Lc. 20,38).
Assim, Jesus pode declarar que “eu vim para que tenham vida, e vida em abundância” (Jo. 10,10b). Ter vida em abundância é a ter em plenitude. É ter o direito de nascer sem interrupção da gravidez em momento algum. Ter vida em abundância e aguardar o momento em que a vida se encerra naturalmente, sem interrupção forçada. Jesus gera vida abundantemente, todos nós devemos ser promotores da vida. Em qualquer circunstancia.
“Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos” (Jo. 10,13). Dar a vida é prova de amor. Defender a vida com a própria vida é prova de amor. Ir contra a ideologia que produz morte, é dar a vida pelos outros. Arriscar a própria vida para gerar vida é “dar a vida pelos amigos”.
Não me importa que se você é de direita, de esquerda ou de centro. Você, por ser cristão católico apostólico romano, deve ser contra o ABORTO. Defenda a vida!

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

"Eis o lenho da cruz, do qual pendeu a salvação do mundo! Ó vinde adoremos!"

Com a frase que dá título a essa postagem, fazemos a veneração a santa cruz na sexta-feira santa.
Para os romanos, a cruz era um instrumento de tortura e morte. Para os gregos, uma loucura. Para os cristão, caminho e porta para a salvação. Sem a cruz não há ressurreição. Para se ter a vida eterna é preciso assumir a cruz de cada dia. Jesus disse que quisesse se salvar deveria renunciar a si mesmo, tomar a sua cruz, e segui-lo.
Hoje, na Festa da Exaltação da Santa Cruz, lembremos que todos os dias carregamos as nossas cruzes. Que a cada dia devemos superar as tentações do mal. Que os chamados pecados capitais nos rondam todos os dias. E cada um de nós sabemos qual pecado devemos eliminar de nossa vida. Não devemos ter "pecadinhos" de estimação. Esses nos fazem pessoas ruins. Aprendamos que a cruz é sinal de libertação. A cruz é sinal de vida (Moisés e a serpente). A cruz é a certeza, é a chave e a porta de entrada no reino dos céus.

domingo, 11 de setembro de 2016

"Estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi encontrado". (Lc.15,24.32)

Hoje celebramos o domingo da Misericórdia. A liturgia católica propôs a meditação do capítulo 15 do evangelho de Lucas. O evangelista apresenta as "parábolas da misericórdia". Trata-se da ovelha e a moeda perdida, e a do pai misericordioso, ou Filho Pródigo.
Três histórias que tocavam naquilo que era muito caro aos fariseus e os mestres da lei. O capítulo inicia-se com a disputa entre estes com Jesus. Questionavam-no sobre porque ele convivia com pecadores. Ao invés de dar uma resposta direta, Jesus prefere falar a linguagem deles. Nas três parábolas, destaca-se a questão financeira. Perder uma ovelha, era perder dinheiro; perder uma moeda de prata, era perder um dia de trabalho para o pobre; dar a parte da herança para um filho, significava deserdá-lo, ou seja, deixaria de ser filho. O pai não teria mais obrigações sobre aquele filho. Todas as três estavam dentro da lógica da lei judaica. Até aí, nada de mais.
O que torna essas histórias diferente na boca de Jesus? A diferença está na forma como o Pai, Deus, trata cada situação dentro da perspectiva divina, religiosa.
Se vocês sabem cuidar daquilo que lhes dá lucro, quanto mais Deus que lhes vê como filhos e filhas.
Uma ovelha custava muito caro. Perder um animal desses era perder dinheiro. Então Jesus afirma que se eles sabem recolher uma ovelha por dinheiro, mais ainda Deus que vê cada um dos seres humanos como filhos. E esses filhos se perdem (ou se perderam) por causa do pecado, inclusive seus interlocutores. Cada uma dessas pessoas resgatas, trazidas de volta para o Pai, convertida, causará alegria no céu.
Segundo, a moeda perdida. Uma moeda de prata significava um dia de trabalho. Era o necessário para um pobre sobreviver. Perder uma moeda de prata era não ter garantida a ração diária da sobrevivência. Portanto, perder essa moeda, era perder um dia de vida. Por isso, aquela mulher fez de tudo para encontrar essa moeda. Teve que fazer uma faxina na casa (muitas vezes precisamos fazer uma faxina na nossa vida) para encontrar a moeda. Quando encontra a moeda, a mulher é tomada por uma alegria tão grande, que precisa partilhar com as amigas e vizinhas. Então Jesus afirma, se isso é motivo de alegria, encontrar algo material, quanto mais ficarão alegres os anjos quando um pecador se converter.
E por último, a maior das história de conversão e misericórdia. A parábola chamada do Filho Pródigo, ou, modernamente, do Pai Misericordioso.
Uma família como outra qualquer. Um pai com posses, tendo ao lado seus filhos que trabalhavam juntos. Viviam bem. Tinham tudo ao seu dispor. Certo dia, um dos filhos, o mais moço, o mais inexperiente pede a parte da herança que lhe cabia. Neste momento, ele era deserdado, perdia os direitos de sucessão. Não poderia reivindicar mais nada para si quando o pai morresse. Além do dinheiro, assinaria um documento dizendo que já havia recebido sua herança.
Sem questionar, o pai dividiu os bens, e lhe deu o que lhe era devido. De posse da herança, o filho parte. Vai embora. Vai viver a vida. Se entrega a toda sorte que o mundo lhe oferecia. Tudo o que o dinheiro poderia pagar e comprar, o filho esbanja. 
Ao acabar o dinheiro, começa uma vida de penúria. Passa por necessidades. Fome. Desprezo. Não consegue trabalho digno. Todos voltam as costas para ele. Somente alguém, muito cruel, lhe dar um emprego para trabalhar com os porcos (esse animal era considerado impuro pelos judeus). Estar próximo a porcos era a maior das humilhações que um judeu poderia experimentar. Os interlocutores de Jesus entenderam.
Não tendo o que o comer, o filho cai em si. Decide voltar para casa. Não mais como filho, pois havia perdido essa condição, era deserdado, fora emancipado ao pedir a herança antes do tempo. Mas lembra-se de que os empregados de seu pai são tratados com dignidade. Tem comida e lugar para repousar a cabeça. Tem roupa, água, banho. Então, começa o caminho de volta. Vinha pela estrada escolhendo as palavras. "Não sou mais seu filho, trata-me como um empregado". 
Mas, ao chegar, ainda ao longe, o pai ao avistá-lo, parte em sua direção. Corre ao encontro. Abraça o filho. Beija-o. Acolhe-o. A tanto tempo esse pai esperava essa filho voltar. O filho então diz o que vinha pensando pelo caminho. Mas o pai não quer saber. Ele manda que os empregados o tratem com a dignidade de filho. Coloquem o anel no dedo, tragam uma sandália, busquem o novilho gordo, preparem a festa. É preciso festejar. "Porque este meu filho estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi encontrado".
Aqui se concretiza a parábola do Pai Misericordioso. Recebe o filho que havia pecado, mas retorna à casa, com misericórdia e acolhimento. Aqui poder-se-ia acabar a parábola. Pronto. Aquele que havia partido coltou.
Entretanto, neste ponto, aparece o filho mais velho; o irmão do mais novo. A caracterização dos fariseus e mestres da lei. Os considerados puros diante de Deus e da lei. Este filho indaga ao pai sobre aquele festa para uma pessoa que não era mais filho, pois havia pedido a parte da herança que lhe cabia. Mas esse pai não pode deixar que isso aconteça. Sua misericórdia estende-se aos dois filhos. É preciso mostrar ao mais velho que o resgate do irmão é mais importante que qualquer lei. E diz, "este teu irmão estava morto e tonou a viver; estava perdido e foi encontrado".
O pai via que o filho-irmão estava perdido e morto e foi encontrado com vida. Regressou. Recebeu a graça da vida. 
Assim, vemos que Jesus resgata todos aqueles que buscam com sinceridade a conversão. A mudança de vida. Que o reconhecem como a presença de Deus-Pai no meio de nós.
Aprendamos a viver a misericórdia. Não somos melhores que os outros. Que a lei mata e escraviza. Mas a caridade, o amor, a entrega, a misericórdia resgata e salva.
Assim, podemos repetir a oração: "Ó Deus, criador de todas as coisas, volvei para nós o vosso olhar e, para sentirmos em nós a ação do vosso amor, fazei que vos sirvamos de todo coração. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém"!

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Deus conosco.

Lc. 16,16-23
Jacó gerou José, o esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, que é chamado o Cristo. 18A origem de Jesus Cristo foi assim: Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José, e, antes de viverem juntos, ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo. 19José, seu marido, era justo e, não querendo denunciá-la, resolveu abandonar Maria, em segredo. 20Enquanto José pensava nisso, eis que o anjo do Senhor apareceu-lhe, em sonho, e lhe disse: "José, Filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque ela concebeu pela ação do Espírito Santo. 21Ela dará à luz um filho, e tu lhe darás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados". 22Tudo isso aconteceu para se cumprir o que o Senhor havia dito pelo profeta: 23"Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de Emanuel, que significa: Deus está conosco".
Hoje celebramos a natividade de Maria, não de Jesus. Entretanto, não há texto bíblico que fale no nascimento de Maria. O que temos, e sabemos, foi tirado dos chamados evangelhos apócrifos, ou seja, aqueles que não foram reconhecidos como inspirados.
Mas isso é o que menos importa neste momento. Celebrar o nascimento de Maria, ou seja, sua natividade, é inseri-la no contexto dos principais nascimentos da época de Jesus. Maria, João Batista, e Jesus.
A lista apresentada por Mateus coloca Maria diante de três mulheres, Tamar-Raab-Rute. Cada uma, a seu tempo, tiveram um papel importante na caminhada do povo hebreu. Então, ela saudada como a mãe de Jesus, o Emanuel, o “Deus conosco”. Deus se faz presente no meio através de uma mulher, que tem uma linhagem. Uma origem.
Maria foi preservada do pecado. Nasceu livre da corrupção humana. Já era destinada a ser a mãe daquele que viria ao mundo para resgatá-lo.
A natividade de Maria lhe dá as credenciais para não passar pela corrupção da morte. A natividade de Maria lhe dá as credenciais para ser a mãe de Deus. A natividade de Maria lhe dá a credencial para educar Jesus na fé judaica. A natividade de Maria lhe dá a chance de mostrar a Jesus como as criaturas se relacionavam com Deus-Pai.
É ela que transmite a Deus, no Filho, a humanidade necessária para poder “salvar o seu povo dos seus pecados”.

Ao contemplarmos Maria, ao celebrarmos sua natividade, lembremos que o pecado não nos domina. Lembremos que “Deus está conosco”.

terça-feira, 6 de setembro de 2016

"Jesus foi à montanha para rezar" (Lc 6,12-19)

Lucas 6,12-19
12Naqueles dias, Jesus foi à montanha para rezar. E passou a noite toda em oração a Deus. 13Ao amanhecer, chamou seus discípulos e escolheu doze dentre eles, aos quais deu o nome de apóstolos: 14Simão, a quem impôs o nome de Pedro, e seu irmão André; Tiago e João; Filipe e Bartolomeu; 15Mateus e Tomé; Tiago, filho de Alfeu, e Simão, chamado Zelota; 16Judas, filho de Tiago, e Judas Iscariotes, aquele que se tornou traidor. 17Jesus desceu da montanha com eles e parou num lugar plano. Ali estavam muitos dos seus discípulos e grande multidão de gente de toda a Judéia e de Jerusalém, do litoral de Tiro e Sidônia. 18Vieram para ouvir Jesus e serem curados de suas doenças. E aqueles que estavam atormentados por espíritos maus também foram curados. 19A multidão toda procurava tocar em Jesus, porque uma força saía dele, e curava a todos.
A narrativa dos evangelhos na liturgia católica começa com “naquele tempo”, ou “naqueles dias”. Para nós, significa que se naquele tempo foi feito daquele jeito, hoje devemos repetir o mesmo gesto de Jesus.
Lucas coloca Jesus num lugar a parte. Afastado das multidões. Vai à montanha, lugar sagrado e de encontro com Deus na representação bíblica. Jesus foi à montanha para rezar; entrar em comunhão com Deus. Longe de todo barulho e de toda influência externa que poderia sofrer. Colocou-se diante do Pai. Passou a noite toda em oração. E porque a noite? Por causa do silêncio externo, que leva ao silêncio interior. Deus se faz ouvir no silêncio do coração.
A oração de Jesus não era vazia, e não visava trazer benefícios para ele mesmo. Foi uma oração de escolha. Percebeu que chegava a hora de escolher aqueles que iriam dar continuidade a sua obra; ou melhor, a obra que o Pai iniciou Nele. Assim a oração era fundamental para entender quais seriam chamados de apóstolos.
Dentre seu grupo havia gente de tudo que era espécie. Os seguidores de João Batista, André, Tiago e João. Coletor de impostos, considerados pecadores, pois estavam à serviço do império romano, Mateus. Havia os “revolucionários” que eram contra a dominação romana em Israel, Simão Zelota. O incrédulo, Tomé; precisava ver para crer. O líder pescador, Simão, chamado Pedro. Enfim, um grupo diverso como qualquer aglomerado humano. Um grupo com pessoas diferentes, com jeitos diferentes de pensar e de ver o mundo. Com ideologias distintas. Mas que viam Jesus, e sua mensagem, dentro de suas perspectivas. A mensagem que Jesus trazia era tão universal que se adequou ao modo de vida de cada um deles. Isso é incrível. Pois o que Jesus pregou é possível se adaptar a qualquer forma de vida. Basta não absolutizar seu pensamento.
Após o chamado, desceu a montanha. Voltou à “terra”, um lugar plano. Encontrou pessoas de diversas regiões. Cada uma com seus problemas, doenças e possessões. Cada uma querendo ouvir uma mensagem de esperança e de alento. Sabiam que poderiam encontrar Nele aquilo que a religião oficial já não os dava mais, esperança. Palavras de vida eterna; Misericórdia de Deus. E mais do que isso, a cura para os males. Viam em Jesus o verdadeiro rosto misericordioso de Deus, que vendo a aflição de seu povo, vem ao seu encontro para trazer libertação.
Os doze deveriam refletir o mesmo rosto de Jesus. Foi dado a cada um de ser fiel a vontade do Pai. Os doze deveriam ser a continuidade da obra e missão até a consumação dos tempos.

Olhando hoje para esse texto, lembremos que oração, chamado, e missão andam juntos. E que devemos ser o reflexo do rosto de Jesus que é a encarnação da misericórdia do Pai.

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

"Os mestres da lei e os fariseus o observavam"

Lucas 6,6-11. Ao ler esse texto, e comparar com nossos dias, com minha vivência religiosa, política e na Pastoral Universitária, percebo o quanto Jesus viveu uma patrulha ideológica. Mais do que a cura, o que me chamou a atenção no texto de hoje foi a seguinte frase: "Os mestres da Lei e os fariseus o observavam, 
para verem se Jesus iria curá-lo em dia de sábado". Quantas pessoas hoje ficam observando se você foi à missa, se você é a favor ou contra o aborto; se você é contra ou a favor de união civil de pessoas do mesmo sexo; se você é contra ou a favor dos LGBTS; se você é contra ou a favor a qualquer coisa que vá de encontro à sua opção moral.
Jesus mostrou que fazer o bem não importa o lugar, o dia nem a quem. Ele dá uma demonstração que não há lugar para que o bem seja feito. Nem que devemos escolher pessoas para que recebam o bem. Jesus demonstra liberdade diante da patrulha ideológica a qual sofria no seu tempo. Devemos nos libertar disso hoje. Ele nos convida a olharmos o ser humano com olhos de um Deus que nos resgata. Um olhar de mãe (em nossa cultura latina a mãe é mais condescendente), que entende o filho/filha. Regras não podem nos impedir de fazer o bem.
Esse foi o exemplo de Santa Tereza de Calcutá. Fez o bem sem olhar a quem. Vestiu-se como as indianas, usava um sari. Abandonou o hábito religioso da congregação a qual pertencia para ficar mais próxima das pessoas pobres e sofredoras. Fez-se uma como as outras. Tornou-se indiana (seguiu Paulo de Tarso, fiz grego com os gregos, judeu com os judeus, romano como os romanos, a fim de ganhá-los para cristo).
Ao meditar essa leitura de hoje, senti o forte apelo de não me preocupar com a patrulha ideológica da fé, mas seguir adiante naquilo que Deus quer que seja feito. Amém!