segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção

Então é Janeiro. Costumamos achar que o primeiro mês de um ano civil pode, por superstição, mudar as mazelas dos anos anteriores. A isso, damos o nome de Esperança. Queremos acreditar que tudo é possível ser diferente. Desejamos aquilo buscamos, ou que não temos: dinheiro, paz, saúde, prosperidade etc.
Para os que creem,  o primeiro mês do ano começa com a ação de graças à mãe de Jesus, Maria santa e fiel. As leituras de hoje falam de bênçãos, de nascimento, de circuncisão. De apresentação no templo.
A primeira leitura, do livro dos Números (6,22-27), Deus instrui Moisés,  como deverá ser dada a bênção através de Aarão. Antes de falarmos sobre a bênção, percebamos que não será Moisés, o escolhido, para dar a bênção sobre o povo. E sim, seu irmão, Aarão.
Segundo, a bênção é dada em nome do Senhor. É Deus quem abençoa. Segue-se o texto: “O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face, e se compareça de ti! O Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz”!
Ao invocar a bênção percebemos que é Deus que nos guarda. E nós guarda quando lhe invocamos a bênção. Em seguida, a bênção pede que o Senhor tenha misericórdia de nós, que se compadeça de nós, e essa compaixão se manifesta sobre o brilho da face de Deus sobre nós. Quando o Senhor pousada sobre nós o seu olhar, sua misericórdia se estende sobre nós.  Logo, ele nos dá a paz. Paz que vem do olhar, do rosto divino contemplado.
Ao falar aos Gálatas  (4,4-7), Paulo nos fala de nossa filiação divina, e sendo filhos, somos herdeiros da graça.
No evangelho (Lc. 2,16-21), temos duas narrativas distintas. A primeira, fala da chegada dos pastores a Belém. Ao local do nascimento de Jesus. E lá estava a Sagrada Família. Percebam que o menino ainda não está nomeado. É simplesmente chamado de “recém-nascido”. Os pastores mantém um breve diálogo com os que estão ao redor. Contam o que ouviram do anjo (lembra-se da noite de Natal?). Lucas acrescenta que Maria guardava essas coisas no seu coração. E meditava sobre elas. Maria ainda estava impactada em saber quem era aquela criança que ela acabará de dar à luz.
O último versículo diz que quando passou os dias da purificação da mãe e do menino (21) Jesus foi circuncidado. E recebeu o nome de Jesus (Yeshu’a que significa “Deus salva”, ou “Deus é salvação”).
Assim, iniciamos o primeiro mês de um novo ano.
Mais do que repetir velhas palavras de saudação, façamos como o salmista, e digamos:
“Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção, / e sua face resplandeça sobre nós! / Que na terra se conheça o seu caminho / e a sua salvação por entre os povos”.
Ainda existem encarcerados e doentes precisando de nossa visita. Há pessoas com fome e sem água potável. Há os refugiados e perseguidos por causa da justiça.
Que sejamos promotores da paz, para sermos chamados filhos/filhas de Deus.
Um 2019 de fé e esperança; mas de resistência e coragem para denunciarmos o que não é de Deus.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

As armas da caridade

Dos Sermões de São Fulgêncio de Ruspe, bispo

(Sermo 3,1-3.5-6: CCL 91 A, 905-909)

(Séc. VI)


Ontem, celebrávamos o nascimento temporal de nosso Rei eterno; hoje celebramos o martírio triunfal do seu soldado.

Ontem o nosso Rei, revestido de nossa carne e saindo da morada de um seio virginal, dignou-se visitar o mundo; hoje o soldado, deixando a tenda de seu corpo, parte vitorioso para o céu. O nosso Rei, o Altíssimo, veio por nós na humildade, mas não pôde vir de mãos vazias. Trouxe para seus soldados um grande dom, que não apenas os enriqueceu imensamente, mas deu-lhes uma força invencível no combate: trouxe o dom da caridade que leva os homens à comunhão com Deus. Ao repartir tão liberalmente o que trouxera, nem por isso ficou mais pobre: enriquecendo de modo admirável a pobreza dos seus fiéis, ele conservou a plenitude dos seus tesouros inesgotáveis. Assim, a caridade que fez Cristo descer do céu à terra, elevou Estêvão da terra ao céu. A caridade de que o Rei dera o exemplo logo refulgiu no soldado.

Estêvão, para alcançar a coroa que seu nome significa, tinha por arma a caridade e com ela vencia em toda parte. Por amor a Deus não recuou perante a hostilidade dos judeus, por amor ao próximo intercedeu por aqueles que o apedrejavam. Por esta caridade, repreendia os que estavam no erro para que se emendassem, por caridade orava pelos que o apedrejavam para que não fossem punidos.

Fortificado pela caridade, venceu Saulo, enfurecido e cruel, e mereceu ter como companheiro no céu aquele que tivera como perseguidor na terra. Sua santa e incansável caridade queria conquistar pela oração a quem não pudera converter pelas admoestações.

E agora Paulo se alegra com Estêvão, com Estêvão frui da glória de Cristo, com Estêvão exulta, com Estêvão reina. Aonde Estêvão chegou primeiro, martirizado pelas pedras de Paulo, chegou depois Paulo, ajudado pelas orações de Estêvão. É esta a verdadeira vida, meus irmãos, em que Paulo não se envergonha mais da morte de Estêvão, mas Estevão se alegra pela companhia de Paulo, porque em ambos triunfa a caridade. Em Estêvão, a caridade venceu a crueldade dos perseguidores, em Paulo, cobriu uma multidão de pecados; em ambos, a caridade mereceu a posse do reino dos céus.

A caridade é a fonte e origem de todos os bens, é a mais poderosa defesa, o caminho que conduz ao céu. Quem caminha na caridade não pode errar nem temer. Ela dirige, protege, leva a bom termo. Portanto, meus irmãos, já que o Cristo nos deu a escada da caridade pela qual todo cristão pode subir ao céu, conservai fielmente a caridade verdadeira, exercitai-a uns para com os outros e, subindo por ela, progredi sempre mais no caminho da perfeição.

domingo, 23 de dezembro de 2018

Então é Natal!

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Nem todo aquele que diz Senhor, Senhor entrará no Reino dos Céus.

A liturgia de hoje nos coloca diante de um dilema vivido pelas primeiras comunidades cristãs. DE que forma devemos viver, praticar a nossa fé?

Pelo que depreendemos da leitura, nos parece que a comunidade de Mateus achava que bastava dizer Senhor, Senhor para entrar no Reino dos Céus. Que era somente louvar Jesus com a boca para se fazer partícipe do Reino. Que não era necessário ter uma vida coerente com as palavras de Deus.

A perícope de hoje, nos leva a uma reflexão mais profunda: como estamos vivendo o que celebramos? Como estamos vivendo a palavra proclamada no meio de nós? Qual a nossa prática?

Deus preparou um plano de retorno à Terra Prometida, ao Reino dos Céus, (ou de Deus), ao Paraíso Terrestre.

Para se chegar ao Reino é necessário colocar em "prática a vontade do Pai". E que vontade é essa?

Então, perdoar até setenta vezes sete. Alimentar os famintos, dar de beber aos sedentos, vestir os nus, visitar os doentes e encarcerados, acolher os refugiados. Além disso, ser pobre de espírito, ser manso ("aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração), ter fome e sede de justiça, ser misericordiosos, sermos promotores da paz, puros de coração, perseguidos por causa da justiça. É ajudar coxos a andarem, cegos a verem, surdos ouvirem, os mudos falarem.

Jesus compara a Palavra de Deus a uma rocha. Um alicerce firme. Quem ouve a palavra e a põe em prática, é como alguém que alicerça sua vida à pedra fundamental e fundante, a pedra angular, aquela que sustenta toda a construção.

Quem põe sua confiança na palavra de Deus passa por muitas tribulações, mas se mantém inabalável, pois coloca sua confiança em Deus.

Possamos viver hoje essa esperança de que nada é tão ruim que não possa melhorar. Nada é tão desesperador que não possa ser visto com tranquilidade.

Deus é nossa Paz. Disse Jesus: "Eu vos deixo a paz, eu vos dou a minha paz". Quem alicerça sua vida na Palavra de Deus está em paz sempre. Nada poderá nos afastar do amor de Cristo, disse São Paulo.

Que Deus habite em nós nessa preparação para o Natal.

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 21“Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’, entrará no Reino dos Céus, mas o que põe em prática a vontade de meu Pai que está nos céus. 24Portanto, quem ouve estas minhas palavras e as põe em prática, é como um homem prudente, que construiu sua casa sobre a rocha. 25Caiu a chuva, vieram as enchentes, os ventos deram contra a casa, mas a casa não caiu, porque estava construída sobre a rocha. 26Por outro lado, quem ouve estas minhas palavras e não as põe em prática, é como um homem sem juízo, que construiu sua casa sobre a areia. 27Caiu a chuva, vieram as enchentes, os ventos sopraram e deram contra a casa, e a casa caiu, e sua ruína foi completa!”(Mt 7,21.24-27)

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

O povo ficou admirado.

O texto litúrgico de hoje nos remete a dois fatos importantes na vida de Jesus, dos apóstolos, e das multidões.
Jesus está numa montanha. Levam até ele pessoas com as mais variadas doenças possíveis: mudos, aleijados, coxos, cegos.
Em seguida, vendo que não arredavam o pé de junto dele, e já passava três dias, percebe a necessidade de alimentar aquele povo.
Ao fazer a lectio divina, vos convido a meditarem sobre esses dois pontos.
Inicialmente, vejamos, Jesus subiu o monte. O lugar de encontrar Deus. Tal como Moisés, e muitos dos profetas, é no monte que Deus se revela.
Aqui não foge a regra. Jesus se revela no monte. Lá, Deus cura (Rafael). E Jesus é o Deus conosco, o Emmanuel. O Deus que vem ao nosso encontro. E de que forma ele se faz presente? Ele mostra que Deus-Pai é aquele que cura os males do corpo e da alma, e ainda, alimenta. Dá o pão que sustenta na caminhada. Na busca pela justiça, pela promoção da paz. O pão dado por Jesus é o pão que nos faz partir em missão para alimentar os famintos, dar de beber aos sedentos, vestir os nus, visitar os doentes e encarcerados, acolher os refugiados. 
Hoje, olhamos para os mudos, os coxos, os aleijados, os cegos espirituais. Pessoas que não se mexem, não veem, não ouvem os sinais dos tempos. Fechados aos clamores do povo, não conseguem louvar a Deus com a caridade, mas apenas com lábios e repetição de orações.
Jesus deixa-se encontrar naqueles que precisam serem curados e libertos da escravidão que nos aprisiona nos nossos quereres, nas nossas vontades, nas nossas necessidades.

Deixemo-nos inundar para "opção preferencial pelos pobres", marginalizados e excluídos. Façamo-nos apóstolos "da caridade com os pobres" (CNBB Doc 96, nº58), nos envolvendo "com a conquista de sua dignidade e de seus direitos econômicos, políticos e sociais" (CNBB Doc.96,nº 58).
O Evangelho de hoje, nos chama a nos deixar "tocar e sensibilizar pela miséria e pelas provações da vida" (CNBB Doc. 96. nº 58).
E assim, "o povo ficou admirado, quando viu os mudos falando, os aleijados sendo curados, os coxos andando e os cegos enxergando. E glorificaram o Deus de Israel". (Mt.15,31). 
E aprendamos a anunciar o pão que é Jesus, e não fiquemos perdidos como os apóstolos: dizendo, “Onde vamos buscar, neste deserto, tantos pães para saciar tão grande multidão?” (Mt. 15,33)
Deus nos abençoe.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

"Ficai atentos e orai a todo momento"

Queridas irmãs e irmãos,
A liturgia desse domingo nos fala de amor, de esperança, de promessas, de conhecimento de Deus. Além de intimidade com Deus.
Fazendo uma releitura do livro do profeta Jeremias, poderíamos dizer que o Senhor fará "cumprir a promessa de bens futuros para a" nossa casa, nossa família, nossa vida. Em em nosso meio, que Deus faz brotar a justiça. E a justiça de todos é que todos nós conheçamos a Jesus Cristo, o enviado do Pai, para fazer cumprir todas as promessas de retorno ao Reino de Deus.
Diante dessa promessa, o salmista diz que "o Senhor se torna íntimo daqueles que o temem", ou seja, ele se faz familiar, se torna família, com todos os que o buscam de coração sincero, e acolhedor. E ainda, que "lhes dá aconhecer sua Aliança".
São Paulo, ao escrever a comunidade de Tessalônica, afirma que o amor que é concedido por Deus entre nós, "aumente e transborde sempre mais". E é essa a Aliança que Deus faz conosco. E a maior prova desse amor transbordante, foi o Filho, Jesus Cristo, ter derramado na cruz o seu sangue para a nossa libertação. 
Sendo assim, devemos ficar atentos e orarmos "a todo momento" para que possamos ter forças para escaparmos de tudo o que nos possa afastar desse amor, e vivendo nessa esperança, possamos ficar de "pé diante do Filho do Homem".
Queridas e queridos, buscai os caminhos do Senhor, deixai-vos orientar e conduzir-vos pela verdade que vem de Deus. "O Senhor é piedade e retidão; reconduz ao bom caminho (...); Ele dirige os humildes na justiça; e aos pobres ele ensina o seu caminho".
Oremos.
"Ó Deus todo-poderoso, concedei a vossos fiéis o ardente desejo de possuir o reino celeste, para que, acorrendo com as nossas boas obras ao encontro do Cristo que vem, sejamos reunidos à sua direita na comunidade dos justos. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém".
(Leituras: Jr. 33,14-16; Sl 24; 1Ts. 3,12-4,2; Lc. 21,25-28.34-36)

Ai de mim, se não evangelizar!

Das Cartas a Santo Inácio, de São Francisco Xavier, presbítero

 (E Vita Francisci Xaverii, auctore H. Tursellini, Romae, 1596,
Lib. 4, epist. 4 [1542] et 5 [1544])
(Séc. XVI)


Percorremos as aldeias de neófitos, que receberam os sacramentos cristãos há poucos anos. Esta região não é cultivada pelos portugueses, já que é muito estéril e pobre; e os cristãos indígenas, por falta de sacerdotes, nada sabem a não ser que são cristãos. Não há ninguém que celebre para eles as sagradas funções; ninguém que lhes ensine o Símbolo, o Pai-nosso, a Ave-Maria e os mandamentos da Lei de Deus.

 Desde que aqui cheguei, não parei um instante: visitando com freqüência as aldeias, lavando na água sagrada os meninos não batizados. Assim, purifiquei grandíssimo número de crianças que, como se diz, não sabem absolutamente distinguir entre a direita e a esquerda. Estas crianças não me permitiram recitar o ofício divino, nem comer, nem dormir, enquanto não lhes ensinasse alguma oração; foi assim que comecei a perceber que delas é o reino dos céus.

 À vista disto, como não podia, sem culpa, recusar pedido tão santo, começando pelo testemunho do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinava-lhes o Símbolo dos Apóstolos, o Pai-nosso e a Ave-Maria. Observei que são muito inteligentes; se houvesse quem os instruísse nos preceitos cristãos, não duvido que seriam excelentes cristãos.

Nestas paragens, são muitíssimos aqueles que não se tornam cristãos, simplesmente por faltar quem os faça tais. Veio-me muitas vezes ao pensamento ir pelas academias da Europa, particularmente a de Paris, e por toda a parte gritar como louco e sacudir aqueles que têm mais ciência do que caridade, clamando: "Oh! Como é enorme o número  dos que excluídos do céu, por vossa culpa se precipitam nos infernos!"

Quem dera que se dedicassem a esta obra com o mesmo interesse com que se dedicam às letras, para que pudessem prestar contas a Deus da ciência e dos talentos recebidos!

Na verdade, muitos deles, impressionados por esta idéia, entregando-se à meditação das realidades divinas, talvez estivessem mais preparados para ouvir o que Deus diria neles: abandonando as cobiças e interesses humanos, se fizessem atentos a um aceno da vontade de Deus. Decerto, diriam de coração: Aqui estou, Senhor; que devo fazer? (At 9,10; 22,10). Envia-me para onde for do teu agrado, até mesmo para a Índia.

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

CANONIZAÇÃO DOS BEATOS: PAULO VI, OSCAR ROMERO

SANTA MISSA E CANONIZAÇÃO DOS BEATOS: PAULO VI, OSCAR ROMERO, FRANCISCO SPINELLI, VICENTE ROMANO, MARIA CATARINA KASPER, NAZÁRIA INÁCIA DE SANTA TERESA DE JESUS, NÚNCIO SULPRIZIO

HOMILIA DO PAPA FRANCISCO

Praça São Pedro
Domingo, 14 de outubro de 2018

A segunda Leitura disse-nos que «a palavra de Deus é viva, eficaz e cortante» (cf. Heb 4, 12). É mesmo assim: a Palavra de Deus não é apenas um conjunto de verdades ou uma história espiritual edificante. Não! É Palavra viva que toca a vida, que a transforma. Nela, Jesus pessoalmente – Ele que é a Palavra viva de Deus – fala aos nossos corações.

Particularmente o Evangelho convida-nos a ir ao encontro do Senhor, a exemplo daquele «alguém» que «correu para Ele» (cf. Mc 10, 17). Podemo-nos identificar com aquele homem, de quem o texto não diz o nome parecendo sugerir-nos que pode representar cada um de nós. Ele pergunta a Jesus como deve fazer para «ter em herança a vida eterna» (10, 17). Pede vida para sempre, vida em plenitude; e qual de nós não a quereria? Mas pede-a – notemos bem – como uma herança a possuir, como um bem a alcançar, a conquistar com as suas forças. De facto, para possuir este bem, observou os mandamentos desde a infância e, para alcançar tal objetivo, está disposto a observar ainda outros; por isso, pergunta: «Que devo fazer para ter…?»

A resposta de Jesus mexe com ele. O Senhor fixa nele o olhar e ama-o (cf. 10, 21). Jesus muda-lhe a perspetiva: passar dos preceitos observados para obter recompensas ao amor gratuito e total. Aquele homem falava em termos de procura e oferta; Jesus propõe-lhe uma história de amor. Pede-lhe para passar da observância das leis ao dom de si mesmo, do trabalhar para si ao estar com Ele. E faz-lhe uma proposta «cortante» de vida: «Vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres (…), vem e segue-Me» (10, 21). E Jesus diz também a ti: «Vem e segue-Me». Vem: não fiques parado, porque não basta não fazer nada de mal para ser de Jesus. Segue-Me: não vás atrás de Jesus só quando te apetece, mas procura-O todos os dias; não te contentes com observar preceitos, dar esmolas e recitar algumas orações: encontra n’Ele o Deus que sempre te ama, o sentido da tua vida, a força para te entregares.

E Jesus diz mais: «Vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres». O Senhor não faz teorias sobre pobreza e riqueza, mas vai direto à vida. Pede-te para deixar aquilo que torna pesado o coração, esvaziar-te de bens para dar lugar a Ele, único bem. Não se pode seguir verdadeiramente a Jesus, quando se está estivado de coisas. Pois, se o coração estiver repleto de bens, não haverá espaço para o Senhor, que Se tornará uma coisa mais entre as outras. Por isso, a riqueza é perigosa e – di-lo Jesus – torna difícil até mesmo salvar-se. Não, porque Deus seja severo; não! O problema está do nosso lado: o muito que temos e o muito que ambicionamos sufocam-nos; sufocam-nos o coração e tornam-nos incapazes de amar. Neste sentido, São Paulo recorda-nos que «a raiz de todos os males é a ganância do dinheiro» (1 Tim 6, 10). Quando se coloca no centro o dinheiro, vemos que não há lugar para Deus; e não há lugar sequer para o homem.

Jesus é radical. Dá tudo e pede tudo: dá um amor total e pede um coração indiviso. Também hoje Se nos dá como Pão vivo; poderemos nós, em troca, dar-Lhe as migalhas? A Ele, que Se fez nosso servo até ao ponto de Se deixar crucificar por nós, não Lhe podemos responder apenas com a observância de alguns preceitos. A Ele, que nos oferece a vida eterna, não podemos dar qualquer bocado de tempo. Jesus não Se contenta com uma «percentagem de amor»: não podemos amá-Lo a vinte, cinquenta ou sessenta por cento. Ou tudo ou nada.

Queridos irmãos e irmãs, o nosso coração é como um íman: deixa-se atrair pelo amor, mas só se pode apegar a um lado e tem de escolher: amar a Deus ou as riquezas do mundo (cf. Mt 6, 24); viver para amar ou viver para si mesmo (cf. Mc 8, 35). Perguntemo-nos de que lado estamos nós... Perguntemo-nos a que ponto nos encontramos na nossa história de amor com Deus... Contentamo-nos com alguns preceitos ou seguimos Jesus como enamorados, prontos verdadeiramente a deixar tudo por Ele? Jesus pergunta a cada um e a todos nós como Igreja em caminho: somos uma Igreja que se limita a pregar bons preceitos ou uma Igreja-esposa, que pelo seu Senhor se lança no amor? Seguimo-Lo verdadeiramente ou voltamos aos passos do mundo, como aquele homem? Em suma, basta-nos Jesus ou procuramos as seguranças do mundo? Peçamos a graça de saber deixar por amor do Senhor: deixar riquezas, deixar sonhos de funções e poderes, deixar estruturas já inadequadas para o anúncio do Evangelho, os pesos que travam a missão, os laços que nos ligam ao mundo. Sem um salto em frente no amor, a nossa vida e a nossa Igreja adoecem de «autocomplacência egocêntrica» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 95): procura-se a alegria em qualquer prazer passageiro, fechamo-nos numa tagarelice estéril, acomodamo-nos na monotonia duma vida cristã sem ardor, onde um pouco de narcisismo cobre a tristeza de permanecermos inacabados.

Aconteceu assim com aquele homem que – diz o Evangelho – «retirou-se pesaroso» (10, 22). Ancorara-se aos preceitos e aos seus muitos bens, não oferecera o coração. E, embora tivesse encontrado Jesus e recebido o seu olhar amoroso, foi-se embora triste. A tristeza é a prova do amor inacabado. É o sinal dum coração tíbio. Pelo contrário, um coração aliviado dos bens, que ama livremente o Senhor, espalha sempre a alegria, aquela alegria de que hoje temos tanta necessidade. O Santo Papa Paulo VI escreveu: «É no meio das suas desgraças que os nossos contemporâneos precisam de conhecer a alegria e de ouvir o seu canto» (Exort. ap. Gaudete in Domino, I). Hoje, Jesus convida-nos a voltar às fontes da alegria, que são o encontro com Ele, a opção corajosa de arriscar para O seguir, o gosto de deixar tudo para abraçar o seu caminho. Os Santos percorreram este caminho.

Fê-lo Paulo VI, seguindo o exemplo do Apóstolo cujo nome assumira. Como ele, consumiu a vida pelo Evangelho de Cristo, cruzando novas fronteiras e fazendo-se testemunha d’Ele no anúncio e no diálogo, profeta duma Igreja extroversa que olha para os distantes e cuida dos pobres. Mesmo nas fadigas e no meio das incompreensões, Paulo VI testemunhou de forma apaixonada a beleza e a alegria de seguir totalmente Jesus. Hoje continua a exortar-nos, juntamente com o Concílio de que foi sábio timoneiro, a que vivamos a nossa vocação comum: a vocação universal à santidade; não às meias medidas, mas à santidade. É significativo que, juntamente com ele e demais Santos e Santas hodiernos, tenhamos D. Óscar Romero, que deixou as seguranças do mundo, incluindo a própria incolumidade, para consumir a vida – como pede o Evangelho – junto dos pobres e do seu povo, com o coração fascinado por Jesus e pelos irmãos. E o mesmo podemos dizer de Francisco Spinelli, Vincente Romano, Maria Catarina Kasper, Nazária Inácia de Santa Teresa de Jesus e também do nosso jovem abruzo-napolitano, Núncio Sulprizio: o santo jovem, corajoso, humilde que soube encontrar Jesus no sofrimento, no silêncio e no dom de si mesmo. Todos estes Santos, em diferentes contextos, traduziram na vida a Palavra de hoje: sem tibieza, nem cálculos, com o ardor de arriscar e deixar tudo. Irmãos e irmãs, que o Senhor nos ajude a imitar os seus exemplos!

domingo, 25 de novembro de 2018

Venha o teu reino

Do Opúsculo sobre a Oração, de Orígenes, presbítero

(Cap. 25: PG 11,495-499)
(Séc. III)

Reino de Deus, conforme as palavras de nosso Senhor e Salvador, não vem visivelmente, nem se dirá: Ei-lo aqui ou ei-lo ali; mas o reino de Deus está dentro de nós (cf. Lc 17,21), pois a palavra está muito próxima de nossa boca e em nosso coração (cf. Rm 10,8). Donde se segue, sem dúvida nenhuma, que quem reza pedindo a vinda do reino de Deus pede – justamente por já ter em si um início deste reino – que ele desponte, dê frutos e chegue à perfeição. Pois Deus reina em todo o santo e quem é santo obedece às leis espirituais de Deus, que nele habita como em cidade bem administrada. Nele está presente o Pai e, junto com o Pai, reina Cristo na pessoa perfeita, segundo as palavras: Viremos a ele e nele faremos nossa morada (Jo 14,23). 

Então o reino de Deus, que já está em nós, chegará por nosso contínuo adiantamento à plenitude, quando se completar o que foi dito pelo Apóstolo: sujeitados todos os inimigos, Cristo entregará o reino a Deus e Pai, a fim de que Deus seja tudo em todos (cf. 1Cor 15,24.28). Por isto, rezemos sem cessar, com aquele amor que pelo Verbo se faz divino; e digamos a nosso Pai que está nos céus: Santificado seja teu nome, venha o teu reino (Mt 6,9-10). É de se notar também a respeito do reino de Deus: da mesma forma que não há participação da justiça com a iniqüidade nem sociedade da luz com as trevas nem pacto de Cristo com Belial (cf. 2Cor 6,14-15), assim o reino de Deus não pode subsistir junto com o reino do pecado. Por conseguinte, se queremos que Deus reine em nós, de modo algum reine o pecado em nosso corpo mortal (Rm 6,12), mas mortifiquemos nossos membros que estão na terra (cf. Cl 3,5) e produzamos fruto no Espírito. 

Passeie, então, Deus em nós como em paraíso espiritual, e reine só ele, junto com seu Cristo; e que em nós se assente à destra de sua virtude espiritual, objeto de nosso desejo. Assente-se até que seus inimigos todos que existem em nós sejam reduzidos a escabelo de seus pés (Sl 109,1), lançados fora todo principado, potestade e virtude. Tudo isto pode acontecer a cada um de nós e ser destruída a última inimiga, a morte(1Cor 15,26). E Cristo diga também dentro de nós: Onde está, ó morte, teu aguilhão? Onde está, inferno, tua vitória? (1Cor 15,55; cf. Os 13,14). Já agora, portanto, o corruptível em nós se revista de santidade e de incorruptibilidade, destruída a morte, vista a imortalidade paterna (cf. 1Cor 15,54), para que, reinando Deus, vivamos dos bens do novo nascimento e da ressurreição.

sábado, 24 de novembro de 2018

A participação dos mártires na vitória de Cristo Rei

Carta de Paulo Le Bao-Tinh aos alunos do Seminário de Ke-Vinh, de 1843

(Launay, A., Le clergé tonkiois et se prêtres martyrs, MEP, Paris, 1925, pp. 80-83)
(Séc. XIX)

Eu, Paulo, preso pelo nome de Cristo, quero levar ao vosso conhecimento as minhas tribulações cotidianas que me assaltam de todos os lados, para que, inflamados pelo amor de Deus, possais louvá-lo, porque a sua misericórdia é eterna (Sl 117,1). 
O meu cárcere é verdadeiramente uma imagem do fogo eterno. Aos cruéis suplícios de todo gênero, como grilhões, algemas e ferros, juntam-se ódio, vingança, calúnias, palavrões, acusações, maldades, falsos testemunhos, maldições e, finalmente, angústia e tristeza. Mas Deus, que outrora libertou os três jovens da fornalha acesa, sempre me assiste e libertou-me dessas tribulações, que se tornaram suaves, porque a sua misericórdia é eterna! 
Graças a Deus, no meio desses tormentos que continuam a apavorar os outros, sinto-me alegre e contente, pois não me julgo só, mas com Cristo. Nosso Mestre suporta todo o peso da cruz, deixando-me apenas uma pequena e ínfima parte: não é só testemunha do meu combate, mas combatente, vencedor e consumador de toda luta. Assim, sobre sua cabeça é que foi colocada a coroa da vitória, de cujo triunfo participam também os seus membros. 
Como, porém, Senhor, suportar tal espetáculo, ao ver diariamente os imperadores, os mandarins e seus soldados blasfemarem vosso santo nome, quando estais acima dos querubins e serafins? (cf. Sl 79,3). Eis que a vossa cruz é calcada pelos pagãos! Onde está a vossa glória? Ao ver tudo isso, me inflamo por vós, preferindo morrer com os membros amputados, em testemunho do vosso amor! 
Mostrai, Senhor, o vosso poder, salvando-me e protegendo-me. Que a força se manifeste na minha fraqueza e seja glorificada ante os gentios, pois, se eu vacilar no caminho, vossos inimigos, cheios de orgulho, poderão levantar as cabeças. 
Caríssimos irmãos, ao ouvirdes tudo isto, dai alegremente graças imortais a Deus, do qual procedem todos os bens. Bendizei comigo o Senhor, porque a sua misericórdia é eterna! Minha alma engrandeça o Senhor e meu espírito exulte de alegria em Deus, meu Salvador; porque olhou para a humildade de seu servo (cf. Lc 1,46-48), todas as gerações me proclamarão bendito, porque a sua misericórdia é eterna! 
Cantai louvores ao Senhor, todas as gentes, povos todos, festejai-o (Sl 116,1), porque Deus escolheu o que é fraco no mundo para confundir os fortes, e o que é vil e desprezível (1Cor 1,27-28), para confundir os nobres. Pelos meus lábios e inteligência, Deus confunde os filósofos, os discípulos dos sábios deste mundo, porque a sua misericórdia é eterna! 
Tudo isto vos escrevo, para unirdes à minha a vossa fé. No meio desta tempestade lanço a âncora, a viva esperança que trago no coração, até ao trono de Deus. 
Caríssimos irmãos, correi de tal modo que possais alcançar a coroa: revesti-vos com a couraça da fé (1Ts 5,8), tomai as armas de Cristo, à direita e à esquerda, segundo os ensinamentos de São Paulo, meu patrono. É melhor para vós entrar na posse da vida com um só olho ou privados de algum membro (cf. Mt 5,29), do que serdes lançados fora com todos eles. 
Vinde em meu auxílio com vossas preces, para que possa combater, segundo a lei, o bom combate, e combater até o fim, encerrando gloriosamente a minha carreira. Se já não nos podemos ver nesta vida, tal felicidade nos está reservada para o futuro, quando, junto ao trono do Cordeiro imaculado, exultantes com a alegria da vitória, cantaremos em uníssono eternamente os seus louvores. Assim seja. 

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Os dons de Deus são admiráveis

Da Carta aos coríntios, de São Clemente I, papa
(Cap. 35,1-5; 36,1-2; 37,1.4-5; 38,1-2.4: Funk 1,105-109)
(Séc. I)

Caríssimos, como são maravilhosos, como são preciosos os dons de Deus! Vida imortal, esplêndida justiça, verdade liberta, fé intrépida, temperança santa: tudo isto nossa inteligência concebe. O que será então que se prepara para aqueles que o aguardam? O santíssimo Artífice e Pai dos séculos é o único a conhecer a sua santidade e beleza. Portanto, a fim de participarmos dos dons prometidos, empreguemos todo empenho em ser contados no número dos que o esperam. 

E como se fará isto, diletos? Estabilizando o nosso pensamento em Deus pela fé; procurando com diligência tudo o que lhe é agradável e aceito; fazendo tudo o que se relaciona com a sua vontade irrepreensível; seguindo o caminho da verdade e rejeitando para longe de nós toda injustiça, iniqüidade, cobiça, contestações, maldades e fraudes. 

É este, queridos, o caminho onde encontramos a salvação: Jesus Cristo, o pontífice de nossas oblações, o defensor e o auxílio em nossa fraqueza. Por ele, vemos as profundezas dos céus; por ele contemplamos seu excelso rosto imaculado; por ele foram abertos os olhos do coração; por ele nossa mente, insensata e obscurecida, desabrocha na luz; por ele, o Senhor quis que provássemos da ciência imortal; por ele que é o esplendor da majestade de Deus, e está tão mais alto que os anjos, quanto o nome que recebeu é mais excelente (cf. Hb 1,3-4). 

Combatamos, portanto, irmãos, com todo o vigor, sob seus preceitos irrepreensíveis. Não podem manter-se os grandes sem os pequenos, nem os pequenos sem os grandes: estão misturados e daí sua vantagem. Sirva-nos de exemplo nosso corpo. A cabeça nada é sem os pés como também os pés sem a cabeça; os menores membros são necessários e úteis a nosso corpo todo; ou melhor, todos estão bem entrosados e se sujeitam unanimemente, para que todo o corpo se salve. 

Com efeito, nosso corpo todo se salvará em Cristo Jesus. Assim, cada qual se submeta a seu próximo em conformidade com o dom que por graça lhe foi concedido: o forte proteja o fraco, o fraco respeite o forte; o rico dê ao pobre, o pobre agradeça a Deus por ter-lhe concedido quem o ajude em sua indigência; o sábio, não por palavras, mas pelas boas obras, manifeste sua sabedoria; o humilde não se elogie a si mesmo, mas deixe que outros o façam. Recebamos, assim, todas as coisas de suas mãos. Por tudo devemos dar graças a ele, a quem a glória pelos séculos dos séculos. Amém. 

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

"Bem aventurados..." "Felizes..."

Faço menção a duas passagens bíblicas lidas em dois dias distintos. A primeira, no dia de Finados, 02/11/18. E a segunda, domingo, 04/11/2018.
No texto que lemos na missa em comemoração aos Fiéis Defuntos, que estava relacionado ao livro do Apocalipse de São João, esse apóstolo disse que teve uma visão, e nela viu "um novo céu, e uma nova terra". E ele afirma ter visto descer do céu, de "junto de Deus, a cidade Santa, pronta como a esposa que se enfeitou para seu marido".
Em uma homilia que ouvi, o pregador dizia que a cidade santa que está entre nós é a Igreja. E sendo assim, ela deve estar ornada em santidade para receber o noivo que chegará. Está no meio de nós o novo reino, o reino dos Céus. O Reino de Deus. Somos um povo santo. A nação escolhida para mudar o mundo e as relações sociais. Devemos ser diferentes no trato, no agir, no falar.
Então, como sermos diferentes? E a resposta nos veio na comemoração de Todos os Santos (no Brasil, celebra no domingo dia 04/11/2018), com as Bem Aventuranças.
Como devemos ser e existir? Qual deve ser nosso modo de agir? Como resistir às investidas do mal?
O Evangelho lido nesse domingo foi o das Bem-Aventuranças (ou como em outras traduções, "Felizes"). tirado do livro de Mateus, capítulo 5.
 1 Jesus viu as multidões, subiu à montanha e sentou-se. Os discípulos se aproximaram, 2 e Jesus começou a ensiná-los: 3 «Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. 4 Felizes os aflitos, porque serão consolados. 5 Felizes os mansos, porque possuirão a terra. 6 Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. 7 Felizes os que são misericordiosos, porque encontrarão misericórdia. 8 Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. 9 Felizes os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. 10 Felizes os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. 11 Felizes vocês, se forem insultados e perseguidos, e se disserem todo tipo de calúnia contra vocês, por causa de mim. 12 Fiquem alegres e contentes, porque será grande para vocês a recompensa no céu. Do mesmo modo perseguiram os profetas que vieram antes de vocês.»
Jesus nos ensina como agora diante das diversas situações que se apresentam a nós no mundo: aflições,pobreza, mansidão, os que tem fome e sede (de justiça), os que são misericordiosos, os puros de coração, os promotores da paz, os perseguidos por causa da justiça.
Todas as proposições partem de uma perspectiva positiva. É assim que devem agir os discípulos de Jesus. 
O Papa Francisco escreveu uma exortação apostólica chamada Gaudete Et Exsultate, sobre o chamado à santidade no mundo atual. 
No capítulo 3, ele faz uma reflexão sobre cada umas das Bem-Aventuranças.
O Papa afirma que, "estas palavras de Jesus (...) estão decididamente contracorrente ao que é habitual, àquilo que se faz na sociedade". E ainda que "as bem aventuranças não são um compromisso leve e superficial; pelo contrário, só as podemos viver se o Espírito Santo nos permear com toda a sua força e nos libertar da fraqueza, do egoísmo, da preguiça, do orgulho".
Além disso, o Papa nos convida a nos deixarmos fustigar pela palavras de Jesus, e que suas palavras "nos desafie, nos chame a uma mudança real de vida". E diz, que "caso contra´rio, a santidade não passará de palavras". E neste caso, as bem-aventuranças, são um caminho para se chegar à santidade. E fazermos partes da cidade santa que está no meio de nós.
Deus nos abençoe. Procuremos ser "santos como o vosso Pai é santo".

Caso queira ler a íntegra da exortação do Papa, acesse o link a seguir.
https://w2.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20180319_gaudete-et-exsultate.html

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Oração da rainha Ester

Do Livro de Ester 4,17m-17kk

Naqueles dias: 17mAnte a morte iminente, todo o Israel gritava a Deus com todas as suas forças. 17nA rainha Ester, temendo o perigo de morte que se aproximava, buscou refúgio no Senhor. 17oAbandonou as vestes suntuosas e vestiu-se com roupas de aflição e luto. Em vez de perfumes refinados, cobriu a cabeça com cinza e humilhou o seu corpo com inúmeros jejuns. 17pProstrou-se por terra desde a manhã até ao anoitecer, juntamente com suas servas, e disse: 17q"Deus de Abraão, Deus de Isaac e Deus de Jacó, tu és bendito. Vem em meu socorro, pois estou só e não tenho outro defensor fora de ti, Senhor,17rpois eu mesma me expus ao perigo. 17sSenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que salvaste Noé das águas do dilúvio. 17tSenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que entregaste nove reis a Abraão com apenas trezentos e dezoito homens. 17uSenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que libertaste Jonas do ventre da baleia.17vSenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que livraste Ananias, Azarias e Misael da fornalha ardente.17xSenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que arrebataste Daniel da cova dos leões. 17ySenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que tiveste misericórdia de Ezequias, rei dos Judeus, quando, condenado a morrer, te implorou pela vida e lhe concedeste mais quinze anos de vida. 17zSenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que concedeste um filho a Ana que o pedia com ardente desejo. 17aaSenhor, eu ouvi, dos livros de meus antepassados, que tu libertas, Senhor, até ao fim, todos os que te são caros.17bbAgora, pois, ajuda-me, a mim que estou sozinha e não tenho mais ninguém senão a ti, Senhor meu Deus. 17ccTu sabes que tua serva detestou o leito dos incircuncisos,17ddque não comi à mesa das abominações nem bebi o vinho de suas libações. 17eeTu sabes que, desde a minha deportação, não tive alegria, Senhor, a não ser em ti. 17ffTu sabes, ó Deus, por que trago esta vestimenta sobre a minha cabeça, e que a abomino como um trapo imundo e não a trago nos meus dias de tranquilidade. 17ggVem, pois, em auxílio de minha orfandade. Põe em meus lábios um discurso atraente, quando eu estiver diante do leão, e muda o seu coração para que odeie aquele que nos ataca, para que este pereça com todos os seus cúmplices. 17hhE livra-nos da mão de nossos inimigos. Transforma nosso luto em alegria e nossas dores em bem-estar. 17iiAos que querem apossar-se de tua herança, ó Deus, entrega-os à ruína. 17kkMostra-te, Senhor; ó Senhor, manifesta-te!

terça-feira, 23 de outubro de 2018

Do Tratado do Espelho dos Clérigos

Do Tratado do Espelho dos Clérigos, de São João de Capistrano, presbítero 

(Pars I, Venetiae 1580,2) 
(Séc. XV) 

A vida do clero bom ilumina e serena
Quem foi chamado à mesa do Senhor deve brilhar pelo exemplo de uma vida louvável e correta, longe de toda imundície dos vícios. Vivendo dignamente como sal da terra para si mesmos e para os outros; e como luz do mundo, brilhante de discernimento, iluminando a todos. Aprendam da excelsa doutrina de Cristo Jesus, que diz, não só aos apóstolos e discípulos, mas também a todos os seus sucessores, presbíteros e clérigos: Vós sois o sal da terra; se o sal perder o sabor, com que se salgará? Para nada mais presta, senão para ser lançado fora e pisado pelos homens (Mt 5,13). 
É verdadeiramente pisado pelos homens, qual lodo vil, o clero imundo e sórdido, atolado na sujeira dos vícios e preso nas cadeias das ações criminosas, tido como imprestável tanto para si quanto para os outros. Gregório diz: “Sua vida é desprezível, resta ser rejeitada sua pregação”. 
Os presbíteros que presidem bem serão considerados dignos de dupla honra, sobretudo os que trabalham pela palavra e pela doutrina (1Tm 5,17). De fato, os bons presbíteros exercem dupla dignidade, quer dizer, material e pessoal, ou temporal e espiritual, ou transitória junto com a eterna. Porque, embora por natureza habitem na terra sob o mesmo jugo das criaturas mortais, desejam ansiosamente conviver com os anjos nos céus, como aceitos pelo rei, servos inteligentes. Por esta razão, como o sol, que surge para o mundo nas alturas de Deus, assim brilhe a luz do clero diante dos homens para que, vendo suas boas obras, glorifiquem o Pai que está nos céus (cf. Mt 5,16). 
Vós sois a luz do mundo (Mt 5,14). A luz não se ilumina a si mesma, mas lança seus raios a tudo que a rodeia. Semelhante a ela, a vida luminosa dos bons e justos clérigos, com o fulgor da santidade, ilumina e serena os que a vêem. Por conseguinte, quem foi reservado para o cuidado dos outros, deve mostrar em si próprio de que modo devem eles viver na casa do Senhor. 

FÉ, VIDA E VOTO!

PADRE JÚLIO LANCELLOTTI: FÉ, VIDA E VOTO!
POR:Padre Gegê
Do ponto de vista científico, a neutralidade é um mito, isto é, uma ilusão que, na prática não existe. Desse modo, falar de neutralidade da Igreja (também no campo político) é, igualmente, uma farsa. Dizia Dom Hélder que, sendo impossível ser neutra,  cabia a Igreja decidir de que lado ficaria: do lado dos pobres ou dos ricos. Ao longo da história, reconhece Dom Hélder, a Igreja quase sempre se pôs ao dos poderosos e dominadores. No contexto das eleições 2018, qualquer um desavisado pode perceber posicionamentos divergentes  e diametralmeentre opostos entre bispos, padres, leigos e leigas, todos e todas membros de uma mesma Igreja. Padre Júlio Lanccellotte (como tantos outros bispos, padres e leigos) fez ao longo de sua vida a opção pelos pequenos e indefesos. Hoje, muitos membros da Igreja, para fugir das consequências do Evangelho, o chamam de "vermelho", "comunista", "lulista", "petista", etc. Mas, no fundo, isso é um sinistro  álibi que muitos usam, com verniz de "defensores da fé", para permanecerem do lado dos poderes da terra, salvaguardando, assim, a maciez e a intocabilidade de suas peles límpidas. Para nós, cristãos comprometidos com a Justiça, a Liberdade e a Vida, neste segundo turno das eleições, não está em jogo o PT ou Esquerda (por mais que sejamos acusados disso pelos nossos irmãos de fé), mas como disse Ester, "A vida do povo". Quem da Igreja se colocar desse lado sabe que tem muito a perder. Padre Júlio Lancellotti é um desses...
Do Bolsonaro, a sociedade brasileira e internacional não espera que saia grandes coisas, tendo em vista sua desqualificação quase que total no que se refere ao básico de um ser humano. Mas, da Igreja, essa Sim, apesar de todas as contradições e escândalos, a sociedade ainda espera Grandes atitudes, sobretudo em tempos de escolhas cruciais.
Essa sociedade lúcida hoje olha bem para Igreja e tem inequívoca certeza que acusar de "comunista" quem defende a Vida dos indefesos pondo em risco a própria pele, é, Sim, faltar com a verdade; é usar de um argumento falso e maquiavélico para justificar o medo de perder os cargos, as regalias e os privilégios deste mundo. Por que o Papa Francisco é tão atacado? Não paga o Papa um alto preço por se colocar ao lado dos pobres, conforme São Francisco de Assis? Por que muitos querem a sua cabeça?  A propósito, lembro da cabeça de São João posta na bandeja por conta da insensatez de Herodes enfeitiçado por uma dança. Quem hoje dança diante da Igreja pedindo "cabeças"? E quem são os que estão "dançando" no macabro amolar das facas?
Fundamentalmente, no segundo turno das eleições 2018 está em jogo milhares e milhares de "cabeças" - vidas vulnerabilizadas!
Ser neutro, como disse, é impossível! Seja franco, cristão: de que lado você está?
Todos sabemos que se Jesus ficasse do lado os poderosos, talvez morresse de gripe mas nunca de CRUZ.
Padre Júlio Lancellotti  está do lado dos pobres e fracos; está do lado de Jesus; e esse lugar concreto determina o seu VOTO! E isso não é "comunismo", nem "lulismo", nem "petismo".
ISSO É EVANGELHO‼!

segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Não tenhais medo! Abri as portas a Cristo!

Da homilia do santo João Paulo II, papa, no início do seu pontificado

(22 de Outubro de 1978: A.A.S. 70 [1978], pp. 945-947)(Séc. XX)

Pedro veio para Roma! E o que foi que o guiou e o conduziu para esta Urbe, o coração do Império Romano, senão a obediência à inspiração recebida do Senhor? Talvez aquele pescador da Galileia nunca tivesse tido vontade de vir até aqui. Talvez tivesse preferido permanecer, lá onde estava, nas margens do lago da Galileia, com a sua barca e com as suas redes. Mas, guiado pelo Senhor e obediente à sua inspiração, chegou até aqui!
Segundo uma antiga tradição, durante a perseguição de Nero, Pedro teria tido vontade de deixar Roma. Mas o Senhor interveio: veio ao seu encontro. Pedro, dirigindo-se ao Senhor perguntou: "Quo vadis, Domine?” (Aonde vais, Senhor?). E o Senhor imediatamente lhe respondeu: "Vou para Roma, para ser crucificado pela segunda vez". Pedro voltou então para Roma e aí permaneceu até à sua crucifixão.
O nosso tempo convida-nos, impele-nos e obriga-nos a olhar para o Senhor e a imergir-nos numa humilde e devota meditação do mistério do supremo poder do mesmo Cristo.
Aquele que nasceu da Virgem Maria, o filho do carpinteiro – como se considerava –, o Filho de Deus vivo, como confessou Pedro, veio para fazer de todos nós “um reino de sacerdotes” .
O Concílio do Vaticano II recordou-nos o mistério deste poder e o fato de que a missão de Cristo – Sacerdote, Profeta, Mestre e Rei – continua na Igreja. Todos, todo o Povo de Deus participa desta tríplice missão. E talvez que no passado se pusesse sobre a cabeça do Papa o trirregno, aquela tríplice coroa, para exprimir, mediante tal símbolo,  que toda a ordem hierárquica da Igreja de Cristo, todo o seu "sagrado poder" que nela é exercido não é mais do que serviço; serviço que tem uma única finalidade: que todo o Povo de Deus participe desta tríplice missão de Cristo e que permaneça sempre sob a soberania do Senhor, a qual não tem as suas origens nos poderes deste mundo, mas sim no Pai celeste e no mistério da Cruz e da Ressurreição.
O poder absoluto e ao mesmo tempo doce e suave do Senhor corresponde a quanto é o mais profundo do homem, às suas mais elevadas aspirações da inteligência, da vontade e do coração. Esse poder não fala com a linguagem da força, mas exprime-se na caridade e na verdade.
O novo Sucessor de Pedro na Sé de Roma eleva, neste dia, uma prece ardente, humilde e confiante: “Ó Cristo! Fazei com que eu possa tornar-me e ser sempre servidor do teu único poder! Servidor do teu suave poder! Servidor do teu poder que não conhece ocaso! Fazei com que eu possa ser um servo! Mais ainda: servo de todos os teus servos.”
Irmãos e Irmãs! Não tenhais medo de acolher Cristo e de aceitar o Seu poder!
Ajudai o Papa e todos aqueles que querem servir Cristo e, com o poder de Cristo, servir o homem e a humanidade inteira!
Não tenhais medo! Abri antes, ou melhor, escancarai as portas a Cristo! Ao Seu poder salvador abri os confins dos Estados, os sistemas económicos assim como os políticos, os vastos campos de cultura, de civilização e de progresso! Não tenhais medo! Cristo sabe bem "o que está dentro do homem". Somente Ele o sabe!
Hoje em dia é frequente o homem não saber o que traz no interior de si mesmo, no mais íntimo da sua alma e do seu coração, Frequentemente não encontra o sentido da sua vida sobre a terra. Deixa-se invadir pela dúvida que se transforma em desespero. Permiti, pois – peço-vos e vo-lo imploro com humildade e com confiança – permiti a Cristo falar ao homem. Somente Ele tem palavras de vida; sim, de vida eterna.

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

"Felizes os que promovem a Paz, porque serão chamados Filhos de Deus"


Aproximam-se as eleições para presidente do Brasil de 2018. Dois candidatos disputam as eleições. O primeiro defende as liberdades democráticas. Está ao lado da vida. Preserva o direito das chamadas “minorias”: gays, negros, indígenas, mulheres em situação de risco. Além disso, prega a igualdade entre homens e mulheres. Entende de Ecologia, e prega a defesa da biodiversidade no Brasil. Respeita a liberdade religiosa de um país onde há várias representações religiosas, de vários matizes. Apresenta uma proposta clara de política econômica, tanto para os trabalhadores (aqueles que vendem sua força de trabalho), quanto para os chamados empresários (detentores dos meios de produção, ou capital especulativo).  É transparente em seus posicionamentos. Não oculta nada.
Entretanto, pertence a um partido (chamado dos Trabalhadores) que por razões humanas sucumbiu ao pecado da corrupção, da roubalheira. Alguns de seus integrantes se envolveram em vários escândalos. E é preciso fazer esse mea-culpa para seguir adiante. É como os cristãos católicos que buscam o sacramento da confissão diante das infidelidades que cometeram perante o Deus da vida, o Deus de amor. O Deus misericordioso. Reconhecem os erros, e perdem perdão. O Partido dos Trabalhadores deveriam fazer o mesmo. Agora é o momento histórico para isso. Esse se chama Fernando Haddad.
Do outro lado, temos um candidato que é reformado das forças armadas. Uma pessoa que pensa com a cabeça de militar. Que enxerga no outro um potencial inimigo, sempre. Não é capaz de dialogar com quem se coloca em sua oposição. Seu pensamento é do extermínio. Da aniquilação. Do confronto. Não entende as mulheres e seus anseios e desejo. Não é favorável a demarcação das terras indígenas. Acredita que negros são indolentes. Que as terras quilombolas devam ser “resgatadas” pela nação brasileira. Não aceita que os trabalhadores tenham férias remuneradas, 13º salário, e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Quanto a licença maternidade, onde a mulher, mãe, recebe seu salário para cuidar da vida de uma criança, ele é contra. E ainda afirma que se a mulher engravida deve receber salário menor que o do homem. Como podermos cumprir o mandato de Deus que diz “crescei-vos e multiplicai-vos”?  Além disso, esse candidato discrimina denominações religiosas diferentes da sua. Esse se chama Bolsonaro.
Diante desse quadro, nós, brasileiros, teremos que decidir que posição tomar. Que tipo de país vamos querer nos próximos quatros anos, ou o país da barbárie (Bolsonaro), ou o país da liberdade, da pluralidade, da compreensão, do respeito as leis (mesmo que sejam injustas e não morais) Fernando Haddad.
Então, como religioso, cristão, não poderia me furtar em escrever essas palavras. Jesus Cristo foi condenado pelas forças religiosas, políticas e militares de seu tempo. Jesus foi encarcerado, torturado e morto. Mas, em nenhum momento fugiu a luta. Recentemente, o Papa Francisco proclamou santo da Igreja Católica Dom Oscar Romero, arcebispo de São Salvador. Romero era um bispo palaciano. Vivia nas rodas do poder durante o período da ditadura militar salvadorenha. Romero passou por um processo de conversão. Vários padres e agentes de pastoral da Igreja eram assassinados por denunciar a corrupção das forças militares diante do povo. Estes, violentavam e matavam mulheres. Metralhavam igrejas. Profanavam o sacrário, onde fica recolhido o corpo do senhor para os católicos.
Após o assassinato de seu amigo, Pe. Rutilio Grande, Dom Oscar Romero abre os olhos para o que estava acontecendo. Percebe que o poder constituído nos palácios e quarteis era contra o povo. Queriam ver o povo salvadorenho em situação de escravidão. Submissos.
São Oscar Romero utilizou sua autoridade enquanto arcebispo para fazer essa denúncia. Teve coragem. E aqui faço uma ressalva, ter coragem não significa não ter medo. Ter coragem significa fazer o que deve ser feito, renunciar ao que deve ser renunciado por fidelidade à palavra de Jesus Cristo. A coragem coloca o medo que se sente em segundo plano. Jesus teve medo, e disse “pai afasta de mim esse cálice”, demonstrou o medo; mas, em seguida, afirmou, “contudo seja feita a tua vontade”.
Enquanto religioso. Enquanto cristão católico apostólico romano. Não posso admitir que religiosos apoiem a barbárie. Que apoiem a discriminação. Sejamos coerente com a nossa fé. Defendamos o evangelho de Jesus Cristo. Rezemos mais. Façamos a lectio divina diariamente, ou seja, a leitura medita da palavra de Deus. Lembremos, disse Jesus, “Eu vim para que todos tenham vida”! E, “a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”.
Não sei deixe dominar pelo ódio e pela violência. Não se deixe dominar pela falta de misericórdia.
E encerro com as palavras do Cristo nas bem aventuranças, “Felizes os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus”.
#EleNão

sábado, 13 de outubro de 2018

A responsabilidade do nosso ministério

Das homilias sobre os Evangelhos, de São Gregório Magno, papa

(Hom. 17,3.14: PL 76,1139-1140.1146)

(Séc. VI)

Ouçamos o que diz o Senhor aos pregadores enviados: A messe é grande, mas poucos os operários. Rogai, portanto, ao Senhor da messe que envie operários a seu campo. São poucos os operários para a grande messe (Mt 9,37-38). Não podemos deixar de dizer isto com imensa tristeza, porque, embora haja quem escute as boas palavras, falta quem as diga. Eis que o mundo está cheio de sacerdotes. Todavia na messe de Deus é muito raro encontrar-se um operário. Recebemos, é certo, o ofício sacerdotal, mas não o pomos em prática.

Pensai, porém, irmãos caríssimos, pensai no que foi dito: Rogai ao Senhor da messe que envie operários a seu campo. Pedi vós por nós para que possamos agir de modo digno de vós. Que a língua não se entorpeça diante da exortação, para que, tendo recebido a condição de pregadores, nosso silêncio também não nos imobilize diante do justo juiz. Com frequência, por maldade sua, a língua dos pregadores se vê impedida. Por sua vez, por culpa dos súditos, muitas vezes acontece que seus chefes os privem da palavra da pregação.

Por maldade sua, com efeito, a língua dos pregadores se vê impedida, como diz o salmista: Deus disse ao pecador: Por que proclamas minhas justiças? (Sl 49,16). Por sua vez, por culpa dos súditos, cala-se a voz dos pregadores. É o que o Senhor diz por Ezequiel: Farei tua língua aderir a teu palato e ficarás mudo, como homem que não censura, porque é uma casa irritante (Ez 3,26). Como se dissesse claramente: A palavra da pregação te é recusada porque, por me exacerbar com suas ações, este povo não é digno de escutar a verdade que exorta. Não é fácil saber por culpa de quem a palavra se furta ao pregador. Porque se o silêncio do pastor às vezes o prejudica, sempre causa dano ao povo, isto é absolutamente certo.

Há ainda outra coisa, irmãos caríssimos, que muito me aflige na vida dos pastores, mas para não pensardes talvez que vos faz injúria aquilo que vou dizer, ponho-me também debaixo da mesma acusação, embora me encontre neste posto não por minha livre vontade, mas impelido por estes tempos calamitosos.

Vimos a nos envolver em negócios externos. Um cargo nos foi dado pela consagração e, na prática, damos prova de outro. Abandonamos o ministério da pregação e, reconheço-o para pesar nosso, chamam-nos de bispo a nós que temos a honra do nome, não o mérito. Aqueles que nos foram confiados abandonam a Deus e nos calamos. Jazem em suas más ações e não lhes estendemos a mão da advertência.

Quando, porém, conseguiremos corrigir a vida de outrem, se descuramos a nossa? Preocupados com questões terrenas, tornamo-nos tanto mais insensíveis interiormente quanto mais parecemos aplicados às coisas exteriores.

Por isso e com razão, a respeito de seus membros enfraquecidos, diz a santa Igreja: Puseram-me de guarda às vinhas; minha vinha não guardei (Ct 1,6). Postos como guardas às vinhas de modo algum guardamos a nossa porque, enquanto nos embaraçamos, com ações exteriores, não damos atenções ao ministério de nossa ação verdadeira.

quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Aprendi!

Sou fruto de um preso político.
Sou fruto de um condenado pelos poderosos.
Sou fruto de um crucificado.
Mas, ao mesmo tempo, fui educado por Ele a viver o amor, o perdão, a misericórdia. Aprendi a valorizar o que é diferente de mim.
Aprendi que é dando que se recebe.
Aprendi que onde houver ódio que eu leve o amor.
Aprendi que onde houver ofensas, que eu leve o perdão.
Aprendi que onde houver discórdia, que eu leve a paz.
Aprendi que onde houver erro, que eu leve a verdade.
Aprendi que onde houver desespero, que eu leve a esperança.
Aprendi que houver trevas, eu leve a luz.
Aprendi que eu devo mais consolar, que ser consolado.
Aprendi que eu devo compreender mais, do que ser compreendido.
Aprendi que devo mais amar, do que ser amado.
Aprendi que é dando que se recebe.
Aprendi que é perdoando que se é perdoado.
Aprendi que é morrendo que se vive para a vida eterna.
Aprendi que devemos alimentar os famintos.
Aprendi que devemos dar de beber aos sedentos.
Aprendi que devemos vestir os nus.
Aprendi que devemos visitar os doente e os encarcerados.
Aprendi que devemos acolher os refugiados.
Aprendi que devemos ser instrumentos de paz.
Aprendi que......
..... Devo perdoar até 70 vezes 7.

Fé, Cores e Política


Todas as agremiações, sejam elas religiosas, esportivas, civis, militares, utilizam flâmulas, ou bandeiras, com cores previamente definidas pelas suas lideranças que representam os sentimentos do grupo.
A Igreja Católica não foge à regra. Vivemos um calendário litúrgico, isto é, ao longo do ano civil temos tempos celebrativos próprios que marcam a vida de Jesus.
Roxo, branco, verde e vermelho, são essas as nossas cores. Em poucas palavras, tentarei dizer o que cada uma dessas cores representa para nós.
O Roxo. Significa tempo de penitência ou espera. Momento para maior interiorização da fé. Diante da Palavra de Deus, que atitudes eu tomo. Significa também tempo de espera. Demonstra a expectativa da Igreja que aguarda um novo natal. É o Advento de Deus em nossas vidas.
O Branco. Simboliza a pureza de coração. Ele é utilizado nas comemorações de nossa Senhora, Maria Santíssima, nas celebrações dos santos e santas que não foram martirizados, mas que souberam expressar em suas vidas os ensinamentos de Jesus.
O Verde. Em muitas culturas, é símbolo da esperança. Neste momento, ou tempo litúrgico, aproveitamos para meditar sobre a vida pública de Jesus. Tempo em que ouvimos as palavras catequéticas de Jesus. Neste período, ouvimos leituras que falam do Reino de Deus, como devemos nos relacionar com os outros. Como devemos perdoar.
O Vermelho. Simboliza o sangue dos mártires derramados pela fé. O testemunho que muitos cristãos deram e dão para que se possa pregar o Evangelho. A perseguição não masoquismo, é o mote dessa dar-se. Mas, uma resposta ao apelo de Jesus, “bem-aventurados quando forem perseguidos por causa de mim”.
Na Igreja Católica o vermelho é usado em muitos momentos. Primeiro, nas celebrações da Semana Santa, principalmente na sexta-feira Santa, quando recordamos o martírio de Jesus, ao que damos o nome de Paixão de Cristo. Depois, na vida dos santos que derramaram seu sangue, ou porque simplesmente eram cristão, ou porque assumiram uma prática de acordo com as palavras do Evangelho e contrariaram os interesses dos poderosos desse mundo.
E por último, temos o Terço Missionário. Uma forma que a Igreja usa para rezar pelos cinco continentes. Cada um deles é associado a uma cor. O Branco, Europa; o Amarelo, Ásia; o Verde, África; o Azul, Oceania; e o Vermelho, as Américas.
Ao propor o terço missionário, com as queremos, recorda-se que devemos orar pelos cristãos e pelos povos daqueles continentes. Rezar por suas necessidades, sejam elas espirituais ou materiais.
As cores não nos fazem melhores ou piores do que os outros. A cores são meramente representativas. E marcam fatos de nossa vida social ou religiosa.
Não nos tornemos intolerantes por causa das cores. Há diversidade de cores, tal como uma diversidade de pessoas, de religiões, de ideias e de pessoas.
A diversidade de cores pertence aos filhos e filhas de Deus. Logo após o Dilúvio, Deus criou esse símbolo para lembrar de sua aliança.



sábado, 6 de outubro de 2018

Mãe

Estamos passando por um novo processo eleitoral no Brasil. Infelizmente, em nosso país esse processo é equivocado. Escolhemos, ao mesmo tempo, Presidente, Governador, Senador, Deputado Federal, Deputado Estadual. Isso é um atentado a Democracia, pois Presidente e Governador estão ligados diretamente a vida de um povo específico. São chamados de majoritários. O Presidente deverá governar para o país como um todo. O Governador, para um parcela. Para um estado chamado de confederado, pois somos uma federação de estados.

Já os que concorrem a Deputados ou a Senador, são os representantes parlamentares, isto é, são os representantes diretos de cada um de nós. Essa votação é chamada de proporcional.
Quando juntamos tudo no mesmo espaço, no mesmo momento, perdemos a visão de conjunto.
Então, eu digo, Mãe!
E que Mãe? Neste caso, vou clamar a Mãe do Céu. Maria, mãe de Jesus. Aquela que ensinou a Jesus o que era ser Filho de Deus. Que soube cantar a alegria de Deus ter voltado seu olhar para os pobres, os famintos. Que tomou a decisão de derrubar do trono os poderosos. E elevar os humildes.
Essa é a Mãe que vê a necessidade dos seus filhos prediletos, pois Jesus nos deu a ela como filhos.
A Mãe Maria apareceu para a humanidade de vários jeitos. De várias formas, sob vários títulos. Dentre eles, o de Conceição Aparecida. E é sobre ela que quero falar.
A pequena imagem retrata a estatura de muitas brasileira. Negra. Ao lado dos acorrentados do tempo de sua aparição.
A Nossa Senhora Aparecida surge num momento de aflição de seus filhos pobres e pescadores. Era preciso realizar o milagre da comida, para suprir a fome dos filhos e servir ao governador. Aqueles pescadores pobres estavam entrando no desespero, e ela veio em socorro.
Após surgir do fundo do rio, nas redes dos pescadores, ela pede ao Filho (Jesus) e ele então, providencia a pesca milagrosa, o que já havia feito no mar da Galileia.
Essa mãe, Negra, vem libertar o seu povo da escravidão. Essa mãe, Negra, vem dar a vista aos que estão nas trevas, menina cega. O cavalo que paralisa diante da porta da Igreja por conta da arrogância de seu cavaleiro.
Maria Aparecida, mulher, mãe, negra, preocupada com as necessidades de seu povo, de seus filhos/filhas. Vive nas periferias das cidades. Vive nas periferias existências, vive nas periferias das resistências dos pobres.
Ó mãe Aparecida, olhai para as dores das mulheres desse país. Olhai para as dores dos seus filhos/filhas. Olhai pelas dores daqueles que são discriminados por serem diferentes de mim. Olhai pelos que passam fome. Olhai pelos que se organizam para mudar a situação de vida. Amém.

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Onde houver ódio, que eu leve o amor!

Hoje celebramos a memória de São Francisco de Assis.
Muitas vezes, temos uma visão romântica do jovem de Assis. Simplesmente, falamos de seu amor a natureza e aos animais.
Francisco de Assis tem uma representação muito maior que isso.
Era jovem da classe alta. Seu pai, um grande comerciante na área da tecelagem e do tingimento dos tecidos. Francisco vivia uma vida devassa, como muitos jovens de hoje. Esbanjava. Não tinha limites nem medidas para nada. Vivia da vida fácil e fútil. Zombava das pessoas. Escarnecia dos pobres. Não queria nada com a vida. Como toda classe dominante do seu tempo, até frequentava a Igreja. Ia a Missa por obrigação, e não por devoção. 
Certo dia, o santo deparou-se com um dos empregados de seu pai. Resolveu ir até onde os tecidos eram tingidos. Teve que passar pelas áreas sombrias de Assis. Aquelas cenas o chocaram. Viu que, enquanto esbanjava a sua riqueza material, pessoas perdiam a vida para sustentar todo o seu luxo. Viu-se diante de um "trapo humano" que lhe pedia um pouco de comida.
Esse fato, começou a mudar a sua vida. Tentou pelas vias normais da conversa e da negociação com seu pai, mudar aquela situação. Sempre tendo negativas.
Um dia, durante uma das missas, vendo o lugar onde se ficavam os pobres dentro da Igreja (no fundo e sentados ao chão), decidiu juntar-se a eles. Com suas ricas roupas. 
Ao ver isso, seu pai disse que ali não era o lugar dele. E seu lhe disse que as ricas roupas lhe pertenciam, e que não poderia ficar no chão. Em discussão com pai, dentro da Igreja, Francisco se despiu das ricas vestes. Ficou completamente nu, escandalizando a todas e a todos. Alguém lhe cobriu o corpo. Dando lhe roupas simples e de farrapos. 
No dia que lhe fazemos memória, lembremos das pessoas que sofrem. Lembremos das pessoas que estão sem direitos trabalhistas. Lembremos das pessoas que são mal tratadas em hospitais públicos pela ganância da classe dominante que oprime. 
Francisco não é apenas exemplo de amor a natureza e aos animais. Francisco é exemplo de solidariedade com os pobres, com os esquecidos, ou, como diz o Papa Francisco, com aqueles e aquelas que são as "sobras" desse mundo capitalista.
Rezemos sua oração pensando nos pobres, nos que sofrem, nos que são desprezados, humilhados, inferiorizados. Lembremos que Jesus disse, tudo o que fizeres a um desses pequenos meus irmãos, foi a mim que o fizestes. 
São Francisco de Assis, intercedei por nós.

Devemos ser simples, humildes e puros.

Da Carta a todos os fiéis, de São Francisco de Assis

(Opuscula, edit. Quaracchi 1949,87-94)
(Séc. XIII)

O Pai Altíssimo anunciou a vinda do céu do tão digno, tão santo e glorioso Verbo do Pai, através de seu santo, Gabriel, à santa e gloriosa Virgem Maria, em cujo seio recebeu a verdadeira carne de nossa humanidade e fragilidade. Ele quis, no entanto, sendo incomparavelmente mais rico, escolher a pobreza junto com a sua santíssima mãe. Nas vésperas de sua paixão, celebrou a Páscoa com os discípulos. Depois, orou ao Pai dizendo: Pai, se for possível, afaste-se de mim este cálice (Mt 26,39).

Pôs, contudo, sua vontade na vontade do Pai. E a vontade do Pai era que seu Filho bendito e glorioso, dado a nós e nascido para nós, se oferecesse em sacrifício e vítima no altar da cruz, pelo seu próprio sangue. Sacrifício não para si, por quem tudo foi feito, mas por nossos pecados, deixando-nos o exemplo para lhe seguirmos as pegadas (cf. 1Pd 2,21). E quer que todos nos salvemos por ele e o acolhamos com coração puro e corpo casto.

Ó como são felizes e benditos aqueles que amam o Senhor e fazem o que o mesmo Senhor diz no evangelho: Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e ao próximo como a ti mesmo!(Lc 10,27). Amemos, portanto, a Deus e adoremo-lo com coração puro e mente pura porque, acima de tudo, disto está ele à procura e diz: Os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade (Jo 4,23). É necessário que todos que o adoram, o adorem no espírito da verdade. E dia e noite elevemos para ele louvores e orações, dizendo: Pai nosso que estás nos céus (Mt 6,9); porque é preciso orar sempre e não desfalecer (cf. Lc 18,1).

Além disto, produzamos dignos frutos de penitência (cf. Mt 3,8). E amemos os próximos como a nós mesmos. Tenhamos caridade e humildade e façamos esmolas, já que estas lavam as almas das nódoas dos pecados. Os homens perdem tudo o que deixam neste mundo. Levam consigo somente a paga da caridade e as esmolas que fizeram: delas receberão do Senhor o prêmio e a justa recompensa.

Não nos convém sermos sábios e prudentes segundo a carne, mas temos antes de ser simples, humildes e puros. Jamais desejemos ficar acima dos outros, mas prefiramos ser servos e submissos a toda criatura humana, por causa de Deus. Sobre todos os que assim agirem e perseverarem até o fim repousará o Espírito do Senhor e fará neles sua casa e mansão. Serão filhos do Pai celeste, pois fazem suas obras, e são esposos, irmãos e mães de nosso Senhor Jesus Cristo.

terça-feira, 2 de outubro de 2018

Eles te guardem em todos os teus caminhos.

Dos Sermões de São Bernardo, abade

(Sermo 12 in psalmum Qui habitat, 3.6-8: Opera omnia,
Edit.Cisterc. 4[1966]458-462)
(Séc.XII)

A teu respeito ordenou a seus anjos que te guardem em todos os teus caminhos (Sl 90,11). Louvem o Senhor por sua misericórdia e suas maravilhas para com os filhos dos homens. Louvem e proclamem às nações que o Senhor agiu de modo magnífico a favor deles. Senhor, que é o homem para que assim o conheças? Ou por que inclinas para ele teu coração? Aproximas dele teu coração, enches-te de solicitude por sua causa, cuidas dele. Enfim, a ele envias o teu Unigênito, infundes o teu Espírito, prometes até a visão de tua face. E para que nas alturas nada falte no serviço a nosso favor, envias os teus santos espíritos a servir-nos, confias-lhes nossa guarda, ordenas que se tornem nossos pedagogos.

A teu respeito, ordenou a seus anjos que te guardem em todos os teus caminhos. Esta palavra quanta reverência deve despertar em ti, aumentar a gratidão, dar confiança. Reverência pela presença, gratidão pela benevolência, confiança pela proteção. Estão aqui, portanto, e estão junto de ti, não apenas contigo, mas em teu favor. Estão aqui para proteger, para te serem úteis. Na verdade, embora enviados por Deus, não nos é lícito ser ingratos para com eles, que com tanto amor lhe obedecem e em tamanhas necessidades nos auxiliam.

Sejamos-lhes fiéis, sejamos gratos a tão grandes protetores; paguemos-lhes com amor; honremo-los tanto quanto pudermos, quanto devemos. Prestemos, no entanto, todo o nosso amor e nossa honra àquele que é tudo para nós e para eles; de quem recebemos poder amar e honrar, de quem merecemos ser amados e honrados.

Assim, irmãos, nele amemos com ternura seus anjos como futuros co-herdeiros nossos, e enquanto esperamos nossos intendentes e tutores dados pelo Pai como nossos guias. Porque agora somos filhos de Deus, embora não se veja, pois ainda estamos sob tutela quais meninos que em nada diferem dos servos.

Aliás, mesmo assim tão pequeninos e restando-nos ainda uma tão longa, e não só tão longa, mas ainda tão perigosa caminhada, que temos a temer com tão poderosos protetores? Eles não podem ser vencidos, nem seduzidos, e ainda menos seduzir, aqueles que nos guardam em todos os nossos caminhos. São fiéis, são prudentes, são fortes; por que trememos de medo? Basta que os sigamos, unamo-nos a eles e habitaremos sob a proteção do Deus do céu.

domingo, 23 de setembro de 2018

Os cristãos enfermos

Do Sermão sobre os pastores, de Santo Agostinho, bispo

(Sermo 46,13: CCL 41,539-540)
(Séc. V)

Ao enfermo, diz o Senhor, não fortificastes (Ez 34,4). Diz aos maus pastores, aos pastores falsos, que buscam seu interesse, não o de Jesus Cristo. Aos que se alegram com as dádivas do leite e da lã, mas descuram totalmente as ovelhas e não cuidam das doentes. Parece-me haver diferença entre enfermo e doente – pois costuma-se chamar de enfermos os doentes; enfermo quer dizer não firme, e doente o que se sente mal.Na verdade, irmãos, esforçamo-nos de algum modo por distinguir estas coisas, mas talvez com maior aplicação poderíamos nós ou outro mais entendido e com o coração mais cheio de luz discernir melhor. À espera disto, para que não sejais privados em relação às palavras da Escritura, falo o que penso. É de se temer sobrevenha uma tentação ao enfermo que o debilite. O doente, ao contrário, já adoeceu por alguma ambição e por esta ambição se vê impedido de entrar no caminho de Deus, de submeter-se ao jugo de Cristo.Observai esses homens que desejam viver bem, já decididos a viver bem. São, no entanto, menos capazes de suportar os males do que fazer o bem. Pertence à firmeza do cristão não apenas fazer o bem, mas também tolerar os males. Aqueles, pois, que parecem ardentes nas boas obras, mas não querem ou não podem suportar as provações iminentes, estes são enfermos. Por outro lado, aqueles que amam o mundo e por qualquer desejo mau se afastam até das obras boas, jazem gravemente doentes, visto que pela doença, sem forças, nada de bom podem realizar.O paralítico era um destes, na alma. Os que o carregavam, não podendo levá-lo até junto do Senhor, descobriram o teto e fizeram-no descer. É isto que terias de fazer: descobrir o teto e colocar junto do Senhor a alma paralítica, com todos os membros frouxos, e vazia de obras boas, curvada sob o peso dos pecados e doente com o mal de sua cobiça. Portanto, se todos os seus membros estão frouxos e há paralisia interior para levá-la ao médico – talvez o médico esteja escondido no teu interior: seria este um sentido oculto nas Escrituras – se queres descobrir-lhe o que está oculto, descobre o teto e faze descer diante dele o paralítico.A quem assim não procede e desdenha fazê-lo, ouvistes o que lhe dizem: Aos doentes não fortalecestes, ao fraturado não pensastes (Ez 34,4); já explicamos esta passagem. Estava alquebrado pelo terror das provações. Mas surge algo que restaura a fratura, estas palavras de consolo: Fiel é Deus que não permitirá serdes tentados além do que podeis suportar, mas com a tentação vos dará o meio de sair dela para que a possais suportar (1Cor 10,13).

sábado, 22 de setembro de 2018

“Vinde benditos de meu Pai”!


Fé e política se misturam?!

Após o discurso de Jesus sobre ser o pão descido do céu; onde ele afirma que devemos comer de sua carne e beber do seu sangue para que tenhamos a vida, a partir do versículo 30 até o fim do capítulo 6 do evangelho de João, vemos as pessoas tendo que tomar uma decisão diante de suas das palavras. Muitos dos discípulos tomam a decisão de não mais seguir Jesus. O texto não deixa claro o porquê dessa decisão de abandonar Jesus.

Ao perceber que muitos começam a abandonar o caminho, Jesus volta-se aos apóstolos e pergunta se eles querem ir embora também. Pedro, tomando a palavra, diz: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o santo de Deus.

Ao reconhecermos que Jesus tem palavras de vida, e de vida eterna, observamos que Jesus gera vida, e essa vida começa aqui. Então, quais palavras de Jesus geram vida em nós?
Procuro inspiração nas palavras de Jesus para tomar decisões políticas, decisões religiosas, decisões?

Comer da carne e beber do sangue significa assumir na nossa vida, as palavras e gestos de Jesus. Viver como Jesus viveu.
Em dois textos distintos, vou partilhar o que penso sobre a vida eterna, e a vida aqui na terra. O primeiro, está em Mt. 25,31-46. O segundo, em Mt. 5,1-12.

Como diácono, a pedido da CNBB, devo estar próximo às dores do mundo. Dos pobres. Fazendo a opção preferencial pelos pobres (CNBB, doc 96, parágrafo 58), e pelas suas lutas e conquistas.

Sendo assim, leio a passagem de Mt. 25,31-45 da seguinte forma.

“Tive fome, me destes de comer”. Dar de comer não é apenas dar comida, mas é apoiar políticas públicas que deem emprego e salário digno para que as pessoas possam se alimentar. Que possam alimentar sua família. Que possam ter previdência social digna. Que possam estudar, que possam alimentar a alma tendo liberdade para viver sua opção religiosa, inclusive não tendo religião. Dar de comer é proporcionar ao outro uma vida digna.

“Tive sede, me destes de beber”. Dar de beber é apoiar políticas públicas que se preocupem com saneamento básico, e com o meio ambiente (Laudato si, Papa Francisco). Água gera vida. Água sustenta a vida. Na cruz, ao ser transpassado pela lança, do lado de Jesus jorrou sangue e Água. Essa água, junto com o sangue, gerou uma nova forma de relacionamento social.

“Estava doente, e cuidastes de mim”. Visitar (cuidar) doentes é preocupar-se com a saúde pública de qualidade, com gestão pública (não privada) do sistema de saúde. É valorizar os trabalhadores da saúde e manter hospitais equipados com tecnologia de ponta. Saúde não é mercadoria, não deve gerar lucro. Saúde é direito de todas e de todos, e dever do Estado.

“Estava na prisão, e fostes me visitar”. Visitar os encarcerados é garantir aos privados da liberdade condições dignas de se refazerem do delito cometido. Ter dignidade no tratamento dos presos. Uma política pública que garanta aos encarcerados saúde, educação, formação para o trabalho. Um sistema que garanta a dignidade da pessoa.
“Eu era forasteiro, e me acolhestes”. Acolher os que estão em situação de vulnerabilidade por serem expatriados. Apoiar políticas públicas que se preocupem com aqueles que hoje se encontra em situação de exílio. Refugiados. O povo de Deus viveu essa experiência. Jesus passou pela experiência quando teve que deixar sua terra e ir para o Egito (Mt. 2,19-23).

Essas são palavras que geram vida, e vida em abundância. Por isso Jesus declara que “todas as vezes que fizestes isso a um destes ‘mais pequenos’, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes”!

Viver as palavras de vida eterna é trabalhar para que tenhamos uma nova forma de relações sociais. Um novo mundo. Uma nova sociedade. Concretizar a “Civilização do Amor” (Paulo VI).

Estamos em momento de mudanças políticas e sociais em nosso país. Que saibamos escolher candidatos e partidos que tenham propostas que geram vida, e não sua supressão, em todas as suas instancias, desde a concepção até o seu fim.