A liturgia de hoje, em especial a primeira leitura, tirada do livro dos Atos dos Apóstolos (At. 8,26-40), continua falando da expansão da Igreja de Jesus Cristo após o martírio do diácono Santo Estêvão.
Partindo do Documento da V Conferência Geral do Episcopado Latino Americano e Caribenho, no número 208, onde os bispos dizem esperar dos "diáconos um testemunho evangélico e impulso missionário", detenho-me na ação evangelizadora do diácono Felipe.
O autor dos Atos dos Apóstolos afirma que um anjo dissera a Felipe que partisse. Interessante notar que não é um partida qualquer. Ela não é feita apenas pela moção e unção do Espírito Santo. O anjo comunica a Felipe que ele deve se preparar. Lembra que o caminho é deserto, isto é, existem dificuldades nesta missão.
O lugar de missão do diácono muitas vezes torna-se um deserto pela dureza dos corações das pessoas com as quais ele vai se encontrar. A evangelização não é algo fácil. É preciso estudo e oração. Às vezes, acreditamos que preparar-se é apenas ter formação acadêmica nas cadeiras teológicas. É saber dar as informações racionais da teologia. Entretanto, preparar-se é tornar-se, também, uma pessoa de oração. Confiar na ação de Deus. Colocar todo o trabalho missionário na escuta da Palavra de Deus.
Felipe não questionou o caminho. Não colocou barreiras na escuta e na realização da vontade de Deus. Não agiu conforme aqueles que pediram a Jesus que primeiro enterrassem seus mortos para depois segui-lo (Lc 9,58-61). Felipe prontamente assumiu a missão, "levantou-se e foi".
Ao colocar-se a caminho, logo encontrou alguém que buscava a Deus. Esta pessoa não era judia. Era um eunuco da rainha da Etiópia, um pagão. Não comungante da fé judaica.
Homem culto (pois era administrador do tesouro, e ministro da rainha), vinha lendo o profeta Isaías. Encontrava-se numa situação rotineira, como qualquer um de nós. Estava voltando para casa, lendo. Hoje voltamos para casa ouvindo nossos rádios, vendo televisão. E o que buscamos? Aquele eunuco buscava a Deus. Voltava para casa lendo a Palavra de Deus. Queria encontrar o Senhor, mesmo que fosse em seu carro voltando para casa.
Voltar para casa sempre é reconfortante. Os comentadores das aventuras de Ulysses dizem que suas epopeias estavam ligadas diretamente ao retorno para casa. Lembremos do jovem que pediu a herança, partiu, e voltou para casa. E quantas pessoas que conhecemos que deixaram a Igreja, afastaram-se de Deus, e que hoje estão de volta. Voltar para casa.
Felipe aproxima-se daquele homem, obedecendo a voz do Espírito Santo. Escuta o que ele está lendo. E o interroga: "Tu compreendes o que está lendo?"
Será que compreendemos as coisas de Deus em nossas vidas? Compreendemos nossa ordenação diaconal? Compreendemos a missão que nos é dada pela Igreja? Estamos atentos ao que o Espírito Santo nos fala? Em mensagem enviada aos bispos da Conferência Episcopal Argentina, o Papa Francisco disse: "Peço que rezem por mim, para que eu saiba escutar o que Deus quer e não o que eu quero". Felipe poderia ter colocado empecilhos. Podeira ter dito que o caminho era perigoso, deserto, sem garantias, sem segurança. Que a sua vida deveria ser preservada. Que não poderia tentar a Deus. Tudo coisas racionalmente aceitáveis e justificáveis. Se Felipe tivesse se furtado a acatar a vontade de Deus, manifestada pelo anjo e impelida pelo Espírito Santo, jamais teria evangelizado e batizado o eunuco.
"Tu compreendes o que está lendo?" E o eunuco responde, "como posso, se ninguém me explica?" Sim, minhas irmãs e irmãos, quantas pessoas hoje não entendem a Palavra de Deus pois não há quem a explique. E explicar aqui vai muito além da mera "escola" racional teológica. Explicar é fazer com que outro entenda com o coração a experiência pessoal de Jesus. Felipe havia vivido a experiência da ressurreição do Senhor. Felipe havia recebido o Espírito Santo quando da imposição das mãos dos apóstolos. Felipe fora enviado a evangelizar a região da Samaria (leitura de ontem). O eunuco sabia dos acontecimentos em Jerusalém. Quantas vezes encontramos pessoas que foram batizadas e fizeram a primeira comunhão, e se afastaram da Igreja e ficaram com a catequese infantil; a mesma do eunuco, ainda preso no "primeiro testamento". Felipe, então, expõe a "doutrina" da palavra e da vivência da fé. Aquilo que passou a ser verdade após a ressurreição de Jesus. Felipe passou a anunciar Jesus.
Após ouvir a "pregação" de Felipe o eunuco pergunta se há alguma coisa que o impeça de ser batizado. Faz parar o carro. Dá uma pausa em sua vida. Deixa-se conduzir pelo Espírito Santo. Faz-se batizar. Coloca sua vida nas mãos de Deus. Felipe exerce a diaconia da Liturgia batizando o eunuco.
Logo após o batismo, Felipe é arrebatado para outro lugar. É preciso evangelizar. Pregar a Palavra de Deus. A missão não pode parar. Ficar presa a pessoas, lugares, grupos.
Quanto ao eunuco, seguiu viagem. Mas só que agora de uma forma diferente. Voltou para seus afazeres e responsabilidades, mas sendo um novo homem: "Prosseguiu sua viagem, cheio de alegria".
Vivemos a alegria de nosso batismo? Vivemos a alegria do encontro com Jesus? Vivemos a alegria de nossa vocação diaconal? Vivemos a alegria de nossa vocação matrimonial, sacerdotal, episcopal? Vivemos na alegria do encontro com o Senhor Ressuscitado, ou ainda estamos presos à sexta-feira da Paixão? Damos razões da nosso confiança em Deus?
Oremos: "Ó Deus eterno e onipotente, que nestes dias vos mostrais tão generosos, dai-nos sentir mais de perto vosso amor paterno para que, libertos das trevas do erro, sigamos com firmeza a luz da verdade. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém".
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