segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Sobre a defesa da bandeira do Brasil

Muitas pessoas de boa vontade têm questionado sobre a “cor” da bandeira brasileira. Agarram-se a um objeto como se ele fosse a coisa mais importante para a construção de um país, de uma nação.
As bandeiras não falam por si mesmas. Elas expressam uma representação social. Não trazem em si um valor absoluto. São meramente representativas, simbólicas.
A construção dessa representação passa por uma discussão política. Existe uma lei que fala sobre como deve ser “construída” a bandeira. Qual a disposição das cores, bem como de outras representações dentro dela.
A bandeira do Brasil, que hoje conhecemos, é uma herança do tempo imperial. Foi modificada para adequar-se ao período republicano. Muitos desconhecem a origem das cores na bandeira. Alguns identificam com as riquezas do país, mata atlântica e ouro. Não! Não é isso. Como falei, as cores de nossa bandeira são resquício da bandeira imperial, onde já existiam o verde e o amarelo. O que poucos, ou quase ninguém sabe, é que essas cores representavam as duas casas imperiais que compunham o governo imperial. O verde, a cor dos Braganças; e o amarelo a cor da casa dos Orleans. Ao se passar para a República, houve a necessidade de se adequar o simbolismo.
A frase colocada no meio da bandeira, “ordem e progresso” expressa uma corrente filosófica que dominava dentro do exército brasileiro, o Positivismo. Essa ideologia defende que somente a razão tem valor. Só o que pode ser comprovado cientificamente serve ao ser humano. Deixa de fora a Teologia e a Metafísica. Para o positivista só o material tem valor. Só o que pode ser definido dentro de uma lei científica.
O positivismo não é cristão. Não é crente. Não compreende, nem aceita Deus como centro da vida.
O magistério da Igreja, representado pelos papas, tem demonstrado isso. Em viagem apostólica em setembro de 2011 à Alemanha, no discurso no parlamento alemão, o Papa Bento XVI declarou: “... A base de tal opinião é a concepção positivista, quase geralmente adotada hoje, de natureza. Se se considera a natureza – no dizer de Hans Kelsen - «um agregado de dados objetivos, unidos uns aos outros como causas e efeitos», então realmente dela não pode derivar qualquer indicação que seja de algum modo de carácter ético (Waldstein, op. cit., 15-21). Uma concepção positivista de natureza, que compreende a natureza de modo puramente funcional, tal como a conhecem as ciências naturais, não pode criar qualquer ponte para a ética e o direito, mas suscitar de novo respostas apenas funcionais. Entretanto o mesmo vale para a razão numa visão positivista, que é considerada por muitos como a única visão científica. Segundo ela, o que não é verificável ou falsificável não entra no âmbito da razão em sentido estrito. Por isso, a ética e a religião devem ser atribuídas ao âmbito subjetivo, caindo fora do âmbito da razão no sentido estrito do termo. Onde vigora o domínio exclusivo da razão positivista – e tal é, em grande parte, o caso da nossa consciência pública –, as fontes clássicas de conhecimento da ética e do direito são postas fora de jogo. Esta é uma situação dramática que interessa a todos e sobre a qual é necessário um debate público; convidar urgentemente para ele é uma intenção essencial deste discurso.
O conceito positivista de natureza e de razão, a visão positivista do mundo é, no seu conjunto, uma parcela grandiosa do conhecimento humano e da capacidade humana, à qual não devemos de modo algum renunciar. Mas ela mesma no seu conjunto não é uma cultura que corresponda e seja suficiente ao ser humano em toda a sua amplitude. Onde a razão positivista se considera como a única cultura suficiente, relegando todas as outras realidades culturais para o estado de subculturas, aquela diminui o homem, antes, ameaça a sua humanidade. Digo isto pensando precisamente na Europa, onde vastos ambientes procuram reconhecer apenas o positivismo como cultura comum e como fundamento comum para a formação do direito, reduzindo todas as outras convicções e os outros valores da nossa cultura ao estado de uma subcultura. Assim coloca-se a Europa, face às outras culturas do mundo, numa condição de falta de cultura e suscitam-se, ao mesmo tempo, correntes extremistas e radicais. A razão positivista, que se apresenta de modo exclusivista e não é capaz de perceber algo para além do que é funcional, assemelha-se aos edifícios de cimento armado sem janelas, nos quais nos damos o clima e a luz por nós mesmos e já não queremos receber estes dois elementos do amplo mundo de Deus”. 
O Papa São João Paulo II, na carta Encíclica Fides et Ratio (sobre a fé e a razão), declarou: “No âmbito da investigação científica, foi-se impondo uma mentalidade positivista, que não apenas se afastou de toda a referência à visão cristã do mundo, mas sobretudo deixou cair qualquer alusão à visão metafísica e moral. Por causa disso, certos cientistas, privados de qualquer referimento ético, correm o risco de não manterem, ao centro do seu interesse, a pessoa e a globalidade da sua vida. Mais, alguns deles, cientes das potencialidades contidas no progresso tecnológico, parecem ceder à lógica do mercado e ainda à tentação dum poder demiúrgico sobre a natureza e o próprio ser humano”. Em seguida, continua, “(...) outro perigo a ser considerado é o cientificismo. Esta concepção filosófica recusa-se a admitir, como válidas, formas de conhecimento distintas daquelas que são próprias das ciências positivas, relegando para o âmbito da pura imaginação tanto o conhecimento religioso e teológico, como o saber ético e estético. No passado, a mesma ideia aparecia expressa no positivismo e no neopositivismo, que consideravam destituídas de sentido as afirmações de carácter metafísico. A crítica epistemológica desacreditou esta posição(...)". E acrescenta, “(...) verdade é que uma certa mentalidade positivista continua a defender a ilusão de que, graças às conquistas científicas e técnicas, o homem, como se fosse um demiurgo, poderá chegar por si mesmo a garantir o domínio total do seu destino”. Conclui: “Quanto aos textos bíblicos, e em particular os Evangelhos, a sua verdade não se reduz seguramente à narração de simples acontecimentos históricos ou à revelação de factos neutros, como pretendia o positivismo historicista. Pelo contrário, esses textos expõem acontecimentos, cuja verdade está para além da mera ocorrência histórica: está no seu significado para e dentro da história da salvação. Esta verdade adquire a sua plena explicitação na leitura perene que a Igreja faz dos referidos textos ao longo dos séculos, mantendo inalterado o seu significado originário. Portanto, é urgente que se interroguem, filosoficamente também, sobre a relação que há entre o facto e o seu significado; relação essa que constitui o sentido específico da história”.
E recentemente, em novembro de 2015, em discurso proferido pelo Papa Francisco, aos participantes do “Congresso Mundial promovido pela Congregação para a Educação Católica com o tema: Educar Hoje e Amanhã: uma paixão que se renova”, declarou, “Hoje há a tendência a um neopositivismo, ou seja, a educar para as coisas imanentes, para o valor das coisas imanentes, e isto tanto nos países de tradição cristã como nos países de tradição pagã. O que não significa introduzir os jovens, as crianças na realidade total: falta a transcendência. Para mim, a maior crise da educação, na perspectiva cristã, é este fechamento à transcendência. Somos fechados à transcendência. É preciso preparar os corações para que o Senhor se manifeste, mas na totalidade; ou seja, na totalidade da humanidade que tem também esta dimensão de transcendência. Educar humanamente mas com horizontes abertos. Nenhum tipo de fechamento beneficia a educação”. E acrescentou, “hoje é necessária uma «educação de emergência», é preciso apostar na «educação informal», porque a educação formal se empobreceu por causa da herança do positivismo. Concebe apenas um tecnicismo intelectualista e a linguagem da mente. E por isso empobreceu-se. É preciso interromper este esquema. E há experiências, como a arte, o desporto... A arte e o desporto educam! É preciso abrir-se a novos horizontes, criar novos modelos... Há tantas experiências: conhecestes a que vós apresentastes, «Scholas occurrentes», que procura precisamente abrir, abrir horizontes a uma educação que não se limite apenas a inculcar conceitos. Há três linguagens: da mente, do coração e das mãos. A educação deve mover-se nestes três caminhos. Ensinar a pensar, ajudar a ouvir bem e acompanhar no fazer, ou seja, que as três linguagens estejam em harmonia; que a criança, o jovem, pense aquilo que sente e faz, sinta aquilo que pensa e faz, e faça aquilo que pensa e sente. E deste modo, a educação torna-se inclusiva porque todos têm um lugar; inclusiva também humanamente”. E concluiu, “Pacto educativo interrompido, seletividade, exclusão, herança de um positivismo seletivo: devem-se resolver estas coisas. E ir em frente, ir em frente com este desafio”.
Antes de se exaltar a frase de nossa bandeira; antes de achar que existe uma ordem pré-estabelecida; antes de se achar que somente o cientificismo é a solução para o desenvolvimento de nosso país, devemos entender o que se está por trás dessas afirmações tendenciosas. Não sou eu quem falo. É o magistério da Igreja. São os papas, aos quais damos a devida reverência e respeito.
Jesus crescia em estatura, sabedoria e graça diante de Deus e dos homens. Jesus moldou-se pela cultura de seu tempo, dando respostas concretas à humanidade, isso é crescer em sabedoria e graça.


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